sexta-feira, abril 29, 2005

Uma resposta à altura...



O assunto dos "traseiros" continua a render...

A melhor resposta que lí sobre o assunto, até agora, foi publicada hoje, no jornal O Estado de São Paulo.

Transcrevo a seguir:

"Com todo respeito, presidente, o meu traseiro eu não tiro da cadeira, de jeito nenhum. Mantenho-me sentado, ao menos ele fica protegido. Não é por nada não. É que a gente nunca sabe onde vai ser a próxima investida do seu governo."

João Mellão Neto,
jornalista, foi deputado federal e ministro de Estado.

Um adendo sobre a Les Pêcheurs de Perles



Em atenção ao comentário da minha amiga mariah1979 , no artigo que ontem escrevi, e relendo o que foi escrito, talvez fosse prudente me estender um pouco mais sobre o assunto.

Ontem escrevi:

"A ópera, no entanto, pecava por não se encaixar dentro dos rígidos padrões dos parisienses. Não era uma grand-opéra e muito menos uma opéra-comique. Pecado mortal!"

Talvez eu não tenha sido feliz na colocação. Uma coisa era a opinião rígida do público operático da época e outra é a opinião que temos hoje da obra de Bizet.

Sem dúvida "Les Pêcheurs des Perles" é uma belíssima ópera. Se fez menos sucesso do que "Carmen" deve-se creditar isto, menos às qualidades desta e, mais ao fato de se tratar de uma ópera feita por um jovem de 24 anos, que, compreensivelmente, amadureceu e que tem o seu nome entre os grandes compositores daquela época.

Esse fenômeno se repete com a maioria dos compositores, as primeiras obras carecem do amadurecimento mas, são largamente compensadas pela ousadia, que é característica da juventude.

De Bizet pode-se dizer, colheu um "fracasso" previsível, pois ousou enfrentar "a mais culta platéia do mundo", sem dúvida, o tempo encarregou-se de colocar sua obra no patamar merecido, o de uma das mais belas óperas do mundo.

Se falhas existem no libreto, não se deve responsabilizar Bizet. A consistência da música é inegável, Bizet é um grande compositor.

A bem da verdade, os libretos são, na maioria dos casos, o ponto falho de muitas óperas. É como nos filmes e no teatro de hoje, uma história de centenas de páginas tem que ser condensada em dois ou três atos, em duas horas mais ou menos. Impossível ser fiel à obra literária. São adaptações que requerem árduo trabalho e que raramente não desfiguram o texto original.

Aqui não foi bem o caso, afinal, ao que parece, o libreto foi escrito para a ópera, não era uma adaptação. Um de seus autores, Cormon, reconheceu que o libreto não fez justiça ao nível da música composta por Bizet. Ao menos ele foi humilde.

Se tiverem oportunidade de assistí-la não percam. Tenho certeza que não se arrependerão.

Jacques

quinta-feira, abril 28, 2005

Je crois entendre encore - "Les Pêcheurs de Perles"



Pois é, quando pensei que ainda demoraria um tempo para voltar ao nosso já conhecido Georges Bizet, acabo de ler um artigo publicado num programa do New York City Opera, que no sábado dia 9 de Abril encenou a "Carmen" do mesmo Bizet.

Quem me presenteou o programa sabia que eu iria ler de capa a capa. E não errou, li mesmo!

Há por lá um artigo muito bem escrito, por Michel Phillip Davis, Diretor de Cena Residente da California Opera Association, em cujas palavras me apoiei para redigir essas linhas.

Se, por um acaso, pudessemos nos transportar para o Thêàtre Lyrique de Paris, na noite de 30 de Setembro de 1863, estaríamos alí para assistir a première da primeira ópera de um jovem compositor de 24 anos que estava a ponto de testar a paciência da culta platéia, navegando por águas perigosas, desafiando a tradição do mundo da ópera francesa de então.

Georges Bizet, ainda viveria por mais 12 anos e ainda escreveria a sua grande ópera Carmen, que seria reconhecida como sua obra prima. No entanto veio a falecer logo a seguir e não pôde acompanhar o sucesso que granjearia com essa obra.

Os compositores de ópera desta época deveriam seguir muito rigorosamente ao código imposto pela sociedade de então. Havia caprichos, maneirismos, arrogâncias, preconceitos de toda espécie ditadas pelos diretores da Opéra , pelos críticos e pelos espectadores. Havia mais do que isso, havia uma ordem estabelecida. Essa ordem impunha uma censura a toda e qualquer manifestação que viesse a se opor a essa tradição.

Do mais alto funcionário do Governo até o mais simples dos presentes naquela audição, todos sabiam que havia em Paris, óperas que se encaixavam em dois tipos. Ou era uma grand-opéra (ópera muito elaborada e sem dialogos falados) ou era uma opéra-comique, que era uma ópera mais leve, de viéz cômico ou semi-cômico, normalmente com um final feliz e que continha diálogos que eram falados e não cantados.

Naquela época Paris era o centro do mundo, não apenas para os compositores franceses mas para todos os compositores. Rossini, italiano, Meyerbeer, alemão, Wagner, alemão e Verdi, italiano, gravitavam ao redor de Paris. Já falei aqui da Don Carlos de Verdi que na versão em francês foi acrescida de um enorme balé que foi composto especialmente para ser exibida em Paris.

Léon Carvalho, Monsieur Directeur Général do Thêàtre Lyrique, encomendou Le Pêcheurs des Perles ao custo de 100.000 francos, pagos por subsídios governamentais, a Bizet, um jovem promissor, de apenas 24 anos e a Eugène Cormon (pseudônimo de Pierre-Etienne Piestre) e Michel Carré, os libretistas.

O libreto deixou a desejar, Cormon chegou a afirmar, que se soubessem que Bizet era tão bem dotado como compositor, jamais teriam lhe entregue "cet ours infâme" (algo como, " êsse urso miserável, infâme").

O triângulo central da ópera gira entre dois pescadores de pérolas, Nadir e Zurga, ambos apaixonados por uma casta sacerdotisa, Leila. Tudo isso ambientado em um local longínquo, o Sri Lanka, que era terra conhecida por ninguém (provávelmente) da platéia. E por poucos em Paris, certamente.

A trama era urdida em fatos totalmente equivocados e politicamente incorretos, rituais religiosos incongruentes, juramentos sem sentido, mesmo para aquela sociedade do século XIX, que se intitulava, a mais instruida do mundo.

Mas a música convencia. Já falamos muito aqui da ária "Au fond du temple saint", um dos grandes duetos de toda história da ópera. O dueto tenor-barítono foi um dos preferidos de todos os grandes cantores. Caruso e Ancona, Bjoerling e Merrill, Domingo e Milnes, foram algumas duplas que celebrizaram a ária. Esse tema adeja por toda a ópera e é usada para relembrar a amizade entre Nadir e Zurga, separados e unidos pelo amor à mesma mulher. Quando o tema é ouvido no final da ópera, antes que Zurga faça um último sacrifício e permita que os já amantes, Leila e Nadir, possam fugir juntos, o efeito é de arrepiar.

Outro ponto alto da ópera é a barcarola "Je crois entendre encore", essa ária foi escrita com uma linha melódica que já havia aparecido na Sinfonia em Dó, de 1855 do próprio Bizet. Isso era comum, aproveitar-se de pedaços de obras anteriores ou retrabalhar alguns trechos de outros trabalhos, enfim, era aceitável copiar-se a sí mesmo. Essa ária recapitula e canta a primeira visão de Nadir a Leila e é uma das árias mais sublimes que já foram escritas. Caruso e Alagna estão entre alguns dos cantores que elegeram esta ária como uma de suas favoritas.

A ópera, no entanto, pecava por não se encaixar dentro dos rígidos padrões dos parisienses. Não era uma grand-opéra e muito menos uma opéra-comique. Pecado mortal!

A platéia não reagiu...

O resultado era previsível, Bizet foi execrado. Apesar das qualidades individuais da ópera, Paris ficou estarrecida. A crítica foi impiedosa.

Até quem saiu em defesa de Bizet foi espezinhado. Berlioz, o único crítico que lhe foi favorável, foi vaiado alguns meses depois, no mesmo palco doThêàtre Lyrique, quando apresentou a Segunda Parte de sua titânica Les Troyens. Seu pecado, defender Bizet e reconhecer a qualidade de sua obra, Les Pêcheurs des Perles.

Ninguém mais deu apoio a Bizet. Berlioz, irônicamente, apesar das vaias recebidas, sucedeu a Pescadores de Pérolas e tirou desta, qualquer chance de reapresentação.

Nunca mais Bizet ouviu a sua obra. Ela não mais foi reapresentada nos restantes doze anos de sua curta vida. No entanto, a melodia d´"Au fond du temple saint", foi cantada com um texto denominado "Pie Jesu" em seu funeral em 1875...

Morre Bizet e renasce, póstumamente à sua obra prima, Carmen, para revelar ao mundo a beleza de seu trabalho anterior, Les Pêcheurs des Perles.

Pode-se ouvir a ária "Je crois entendre encore" aqui, por exemplo.

Aos que apreciam ler enquanto ouvem a ária, transcrevo abaixo o seu texto:

Je crois entendre encore

Caché sous les palmiers

Sa voix tendre et sonore

Comme un chant de ramiers.

Oh nuit enchanteresse

Divin ravissement

Oh souvenir charmant,

Folle ivresse, doux rêve!



Aux clartés des étoiles

Je crois encor la voir

Entr'ouvrir ses longs voiles

Aux vents tièdes du soir.

Oh nuit enchanteresse

Divin ravissement

Oh souvenir charmant

Folle ivresse, doux rêve!



Charmant Souvenir!

Charmant Souvenir!

Espero que também gostem.

Jacques

quarta-feira, abril 27, 2005

Lembranças de um Primeiro de Abril

Lembranças...

Até movido por leituras por aí, quero transmitir minhas lembranças de um ido 01 de Abril de 1964.

Não que eu tenha noções muito específicas sobre o que se passava naquela época, até porque eu tinha pouco mais de 16 anos. Para todo fim e efeito eu era um moleque como qualquer outro da minha idade.

Ideologias, posicionamentos pessoais e outros que tais eu só adquiriria bem mais tarde. Vivia eu em Vila Mariana, um bairro de classe média na zona Sul de São Paulo. Desde criança eu estudei no Liceu Pasteur, um colégio de boa reputação, com dois cursos diferenciados, o meu, em Português, e o Lycée Pasteur, totalmente diferente, dirigido à comunidade francesa em prédio diferente e com cursos em francês.

Eu pertencia à classe dos brasileiros. Tinha aulas em português, uma educação nos parâmetros franceses (leia-se, muito rígida para os padrões brasileiros), um francês para valer (e que me é muito útil, até hoje) e a cabeça de um adolescente.

Os acontecimentos da véspera, é verdade, a revolução redentora, de 31 de Março, práticamente e na realidade, foi a de 01 de Abril. Se a data não era exatamente uma realidade a idéia era corrigir o calendário e a data histórica , afinal o que é um dia a mais? Ou a menos?

Para todos fins históricos, Elio Gaspari, com muito mais conhecimento de causa e de história já publicou uma série de livros sobre o fato. Falta um para os cinco livros mas isso é detalhe. É uma perspectiva histórica da Redentora que merece nossa atenção. Uma bela leitura!

Antigamente a história que se estudava era até o século XIX. por mais que o programa rezasse por outra cartilha. Acho que os professores não sabiam muito bem o que se passou depois do advento da República. Ou eram do século XIX mesmo.

O meu testemunho é o de um adolescente que nunca se havia ligado às causas políticas. Portanto me atenho a lembranças de infância e não a dados históricos.

O porque estou relatando? É a experiência de um jovem, nunca tinha passado por nada semelhante...

Logo de manhã, a escola suspendeu as aulas. Algo de muito surpreendente pois o Pasteur era tido como uma escola muito rígida e que não abriria mão de aulas por qualquer bobagem.

Achamos ótimo, afinal quando é que teríamos um dia de gazeta patrocinado pela própria escola?

Meia dúzia se reuniu e resolveu ir para casa de um de nossos colegas. Programa? Pingue-pongue, um futebolzinho na praça (eu era perna-de-pau e não era a minha área), pebolim, muito bate-papo e pouco conteúdo, enfim, assuntos de adolescentes, naquela época ainda não haviam nascido os primeiros aborrescentes...

Ligar para casa, porque? Nem tinha telefone público. Ir para casa, nem pensar...

Vai daí que das 8 até a 1 da tarde nem pensamos em ninguém, a não ser nós mesmos. Idade maravilhosa! Não tinhamos nenhuma maldade, nenhuma preocupação...

Não é o caso de citar nomes, mas poderia repetir nome por nome, endereço de onde estávamos e outros que tais...

Uma da tarde e era hora de voltarmos para casa...

Primeira coisa que notei, do outro lado, na rua que morava, havia um posto de gasolina, uma fila que ia do posto até umas quatro quadras abaixo, justo no caminho da minha casa.

Batendo papo, sem nenhuma malícia, íamos cada um para sua casa.

Ao chegar em casa, uma bronca que não esperava. Onde "você" havia se metido? Porque não havia voltado para casa? O que "seu" pai vai dizer? O rádio ligado, apreensão total. O clima das tranmissões era próximo ao funéreo.

A rádio, me lembro bem, era a Rádio Eldorado. Oscilava entre notícias de "última hora" e marchas cívicas. O clima era de cataclisma...

Mal composto das broncas que levei antes do "seu" (meu) pai chegar, chega o meu pai com fisionomia transtornada...

Eu mal tinha entendido o que estava acontecendo e ainda havia a fúria de meu pai a enfrentar...

Não sei o que era pior, uma revolução, ou a fúria paterna... Difícil escolher....

Chego à conclusão que temia mais a fúria paterna.

Aí é que comecei a tomar conhecimento dos acontecimentos, movimentos de tropas, adesões à revolução, discursos de autoridades...

Minha mãe partiu para o mercado, era necessário deixar a casa abastecida, meu pai, naquela fila da gasolina, por horas, para encher o tanque de nossa Rural Willys, tudo era novidade para mim.

Uma revolução! Para mim era novidade, para eles nem tanto, já sabiam o que fazer.

Parecia que o mundo ia acabar. As notícias eram desconexas, era um tal de adesão para cá adesão para lá, fatos comprovados e fatos criados, afirmações e desmentidos, discursos vazios, discursos vãos, parece que morreu um, mais de um, alguns, nenhum, tropas que iam para o Sul, general que disse, coisa e tal e o pobre adolescente (eu) começou a tomar conhecimento de fatos que iriam transformar as vidas de toda uma geração. E além da minha, a dos que estavam por nascer e daqueles que estavam se despedindo.

Eu, que havia começado o dia exaltando o "feriado" inesperado, jamais poderia saber que aquele dia iria mudar totalmente o resto de nossos dias.

Fui para escola como uma criança e, no mesmo dia, iria me transformar num jovem conscientizado por fatos que cairam na cabeça como adagas, nos quais jamais havia pensado e que não poderia dar juízos de valor, que só muito mais tarde, poderia entender e julgar.

Dizer que envelheci anos naquelas poucas horas, seria repetir um "chavão"? Pois foi o que posso analisar hoje. A minha vida e a de toda uma geração havia dado uma guinada. Jamais seríamos os mesmos, jamais ninguém seria igual.

Um dia ainda conto como decorreu meu período que passei na Cidade Universitária, na Poli, depois de 1966, nos anos que vieram a ser conhecidos como os "anos de chumbo"...

E ainda tem um capítulo que vivenciei na Poli, lá na "vetusta" sede do Bom Retiro, cercado de quartéis, ainda que os politécnicos se considerassem e fossem considerados apolíticos. Foi de arrepiar...

Repito, são vivências, nunca participei de movimentos políticos por estar mais preocupado com os estudos do que a política. Alienação? Provavelmente... Sobrevivência? Certamente...

Ainda assim há muita coisa para ser relatada.

Jacques

terça-feira, abril 26, 2005

Sem título, suíte para calango desacompanhado (e desafinado)

Do nosso pai Aurélio...
"S. m.
1. Bras. Zool. Designação comum a vários reptis lacertílios, teídeos, principalmente os de pequeno porte, Cnemidophorus, Arthroseps, Colobosaura e outros, que vivem ger. no solo, na terra ou em pedreiras, alimentando-se de pequenos artrópodes ou vermes.
2. Bras. Zool. Designação comum a alguns iguanídeos pequenos"

Primeiro foi Maria Antonieta. Aquela...

"Quem não tem pão, que coma brioches", frase famosa atribuída a Maria Antonieta, rainha da França em 1789, época da queda da Bastilha, pouco tempo antes da queda prematura da sua cabeça.

Depois "Nóis" ataca de novo. Aquele...

Muita gente "é incapaz de levantar o traseiro e mudar sua conta para um banco mais barato." "Xinga de noite e de dia se conforma com os juros." Frase essa, dita ontem, ao assinar a lei que cria o Programa Nacional do Microcrédito Orientado.

Prossegue:

"É por isso que eu digo todo o santo dia: estamos transformando o Brasil, que é um país capitalista, num país com capital na mão do povo, ou seja, com um pouco de dinheiro."

Gente, será que eu entendi? Ou será que eu não tenho capacidade? Parece que, além do aforismo de péssimo gosto, agora estamos transformando muito dinheiro em pouco dinheiro?!...

Será?

Mágicas, mágicas, ou talvez, mágicas mágicas?...

Estou boquipasmo! (essa não tem no Aurélio mas, pelo menos, é inofensiva)

Jacques

segunda-feira, abril 25, 2005

"Quis hic locus,quae regio,quae mundi plaga?"

"Que lugar é este, que região, que plaga do mundo?"
Sêneca

Olá!

Sei que pode parecer erudição barata citar filósofos em vão. Gostaria de me desculpar de antemão.

Não era a minha intenção original. O título aqui serve para demonstrar que há milênios o assunto está em baila.

Durante este fim de semana li muitos editoriais. Normalmente leio apenas os do jornal que assino. Intuo que este jornal tem uma linha política definida e que, portanto, assume a defesa de sua ideologia. Como normalmente coincide com a minha, não me espanta de ver expresso em letra de imprensa opiniões que compartilho.

Acontece que, para contentar "gregos e troianos", havia mais de um jornal à nossa disposição, onde me encontrava. Como sempre faço nessas ocasiões, ponho-me a ler todas as colunas que consigo. Não vejo como conseguiria ler todo esse material no dia-a-dia, pois aí não haveria tempo suficiente para toda essa imensa quantidade de leitura.

Pois bem, de tudo que li, cheguei à conclusão que estamos sendo lenientes com nossos representantes do poder. Certo que sou o enésino a chegar à mesma conclusão. Uma série de reportagens já esmiuçou essa afirmação.

O voto é obrigatório, somos obrigados a votar nos candidatos aos cargos eletivos. Fazemos nossa obrigação e esperamos a próxima eleição, que também será obrigatória. Em pouco tempo a maioria de nós simplesmente apaga o nome de quem votou.

Ficamos orgulhosos de nossa democracia e guardamos zelosamente nosso título de eleitor até a próxima eleição. Após o nosso ato patriótico, simplesmente deixamos de acompanhar o desenrolar (ou seria o enrolar?) dos atos dos nossos representantes. Até aqui estamos chovendo no molhado. Ou você acha o contrário?

A partir da afirmação acima, pus-me a pensar no quanto vale o nosso voto... Ora, apesar da grande maioria não lembrar em quem votou e, ainda que nosso candidato não tenha sido eleito, é motivo para aguardar passivamente o desenrolar (enrolar) dos fatos?

A pergunta que eu faço, é suficiente votar e torcer para dar certo? E somos patriotas? E quem é o meu, o seu, o nosso representante?

Se não cobramos deles aquilo que achamos certo, como é que queremos que nossas opiniões sejam ouvidas?

Será que aqueles quatro anos entre eleições são suficiente para darmos a nossa nota ao desempenho de nossos representantes? Óbvio que não!

A meu ver, é necessário atuar nesse intervalo imenso que separa duas eleições. Se não estamos satisfeitos com aquilo que anda por aí, hoje, se a política anda capenga como vem andando, o que eu e você deveríamos fazer? Sermos patriotas! Exigir de nossos representantes uma clara postura de ação.

Se não exigirmos essa postura de ação, estaremos sendo coniventes com que anda acontecendo por aí...

Alguns dirão, os tempos na política são diferentes dos tempos da iniciativa privada. Muito bem, de antemão aceito essa argumentação. O que não dá é ver dia após dia, semana após semana, mes após mes, ano após ano os mesmos assuntos sendo "empurrados" e nenhuma solução seja dada. Cada dia que passa nosso país vai ficando mais para trás. E com ele nós todos estamos indo para trás.

E hora de nós, cidadãos que honramos nossos deveres, exigir de nossos representantes que também assim façam.

E para fazer que isso aconteça precisamos ligar para eles, ou então mandar um e-mail, um fax, uma carta sobre aquele assunto que achamos que não está sendo bem conduzido. E não esquecer de que, quando encontrarmo-nos pessoalmente com esses cidadãos, o questionamento é mais do que válido.

Num desses artigos que li, comentáva-se que os próprios jornalistas ficam sem o "feedback" necessário. Tiragens de centenas de milhares de jornais, diariamente, geram algumas dezenas de cartas , telefonemas, etc.

Televisão do Senado, da Câmara, da Assembléia é para ver como vêm agindo esses portentos... Tirando aquela meia dúzia de assuntos que polariza nossa comunidade, você já tentou ver (e ouvir) quais são os assuntos que campeiam por alí?

Se não começarmos a fazer logo a nossa parte, não poderemos exigir que nosso país comece andar nos trilhos do desenvolvimento.

É isso.

Jacques

quarta-feira, abril 20, 2005

Pausa por uns dias...

De hoje até a próxima segunda-feira, não haverá nada acrescentado por aqui. Para onde vou a internet não chegou.

Bom feriado a todos!

Jacques

Lorem Ipsum

"Neque porro quisquam est qui dolorem ipsum quia dolor sit amet, consectetur, adipisci velit..."
"Não há ninguém que ame a dor, por sí só, que a busque, que a queira, simplesmente por que é dor..."

O texto acima é a origem de um texto padrão, que em várias tipografias é usado como substituto de texto que será posteriormente anexado aos impressos.

Tem a aparência de um texto normal, com distribuição de frases e letras que sugerem nada mais do que um texto aleatório. Aí é que está o sabor da coisa.

Fontes do texto estão disponíveis em vários locais.

Abaixo estão a origem dos textos.

Lorem Ipsum original, que começou a ser usado no século XVI, nas primeiras peças gráficas:

"Lorem ipsum dolor sit amet, consectetur adipisicing elit, sed do eiusmod tempor incididunt ut labore et dolore magna aliqua. Ut enim ad minim veniam, quis nostrud exercitation ullamco laboris nisi ut aliquip ex ea commodo consequat. Duis aute irure dolor in reprehenderit in voluptate velit esse cillum dolore eu fugiat nulla pariatur. Excepteur sint occaecat cupidatat non proident, sunt in culpa qui officia deserunt mollit anim id est laborum."

Secção 1.10.32 de "Finibus Bonorum et Malorum", escrita por Cicero em 45 AC

"Sed ut perspiciatis unde omnis iste natus error sit voluptatem accusantium doloremque laudantium, totam rem aperiam, eaque ipsa quae ab illo inventore veritatis et quasi architecto beatae vitae dicta sunt explicabo. Nemo enim ipsam voluptatem quia voluptas sit aspernatur aut odit aut fugit, sed quia consequuntur magni dolores eos qui ratione voluptatem sequi nesciunt. Neque porro quisquam est, qui dolorem ipsum quia dolor sit amet, consectetur, adipisci velit, sed quia non numquam eius modi tempora incidunt ut labore et dolore magnam aliquam quaerat voluptatem. Ut enim ad minima veniam, quis nostrum exercitationem ullam corporis suscipit laboriosam, nisi ut aliquid ex ea commodi consequatur? Quis autem vel eum iure reprehenderit qui in ea voluptate velit esse quam nihil molestiae consequatur, vel illum qui dolorem eum fugiat quo voluptas nulla pariatur?"

Secção 1.10.33 de "Finibus Bonorum et Malorum", escrita por Cicero em 45 AC

"At vero eos et accusamus et iusto odio dignissimos ducimus qui blanditiis praesentium voluptatum deleniti atque corrupti quos dolores et quas molestias excepturi sint occaecati cupiditate non provident, similique sunt in culpa qui officia deserunt mollitia animi, id est laborum et dolorum fuga. Et harum quidem rerum facilis est et expedita distinctio. Nam libero tempore, cum soluta nobis est eligendi optio cumque nihil impedit quo minus id quod maxime placeat facere possimus, omnis voluptas assumenda est, omnis dolor repellendus. Temporibus autem quibusdam et aut officiis debitis aut rerum necessitatibus saepe eveniet ut et voluptates repudiandae sint et molestiae non recusandae. Itaque earum rerum hic tenetur a sapiente delectus, ut aut reiciendis voluptatibus maiores alias consequatur aut perferendis doloribus asperiores repellat."

Até aqui o texto faz sentido, existem traduções desses trechos.

Um texto de Lorem Ipsum baseado nos textos acima ficaria assim:

"Lorem ipsum dolor sit amet, consectetuer adipiscing elit. Fusce pharetra blandit augue. Duis aliquet velit id arcu. Nam mattis pellentesque wisi. Integer justo odio, adipiscing at, molestie quis, fermentum a, pede. Vivamus enim erat, mattis quis, luctus sed, feugiat in, nibh. Cras faucibus risus ut diam. Curabitur adipiscing. Aenean non lorem. Integer pellentesque wisi quis tortor. Ut sed nunc. In hac habitasse platea dictumst. Donec blandit pulvinar risus. Vestibulum vitae lectus. Morbi accumsan pede id ligula. Nullam egestas magna in magna. Cras scelerisque mi ut nibh. Aenean porta lobortis pede. Pellentesque dolor orci, sodales in, ultrices eget, blandit sed, diam. Praesent sit amet nisl in dui tincidunt vestibulum.

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Por favor , nem tentem traduzir ou procurar tradução, o texto é gerado (quase) aleatóriamente, quanto mais sofisticado o programa fonte, mais embaralhado fica...

Curiosidades...

Jacques

terça-feira, abril 19, 2005

Ópera, um espetáculo de paixão.

A ópera, como manifestação de arte musical e vocal, vem, ao longo do tempo, construindo uma linguagem própria.

Não é de hoje que fenômenos como o aplauso, a vaia e outras manifestações de verdadeira paixão ou ódio se manifestam ao longo dos espetáculos que se sucedem nos teatros líricos espalhados ao redor dos principais centros culturais do mundo.

Assistir a uma ópera é uma experiência totalmente diferente daquela experimentada por uma platéia que disciplinadamente, polidamente, aplaude com maior ou menor intensidade uma orquestra ou um conjunto de câmara.

Primeiro, a ópera, como espetáculo, é a sucessora longínqua dos espetáculos que aconteciam em praça pública por grupos teatrais medievais que se exibiam nas praças centrais das cidades.

Isso implicava na interação entre a platéia e os atores.

Havia, por exemplo, a torcida da mocinha, que aplaudia quando esta pregasse uma peça, por exemplo, na madastra (que por sua vez também tinha a sua torcida) e era vaiada pela torcida desta última.

Multiplique-se cada torcida, vaiando ou aplaudindo a trama, ao sabor dos acontecimentos que se desenvolviam numa arena, provávelmente o centro da praça, pelo número de atores dessa peça e teremos uma idéia do que acontecia nesses espetáculos.

Grande parte de nós já vimos esse tipo de reação quando levamos nossos filhos a um espetáculo de teatro infantil onde tal comportamento, na maioria dos casos faz parte do envolvimento de nossas crianças torcer pelo mocinho e vaiar o bandido.

A ópera, simplificadamente, é a sucessora daqueles espetáculos de menestréis que se apresentavam nas aldeias ancestrais.

Assim é que a ópera herdou grande parte desse tipo de reação dos espectadores.

Não seria aceitável um grande tenor, da estatura dos maiores atualmente do mundo, ser vaiado em plena cena, como Pavarotti o foi, numa de suas últimas apresentações no Metropolitan Opera de New York. Pois foi o que aconteceu. E certamente não foi o primeiro e nem será o último.

Tenho, no entanto, a gravação do mesmo Pavarotti, na ópera Tosca, no papel de Cavaradossi, onde, no vídeo, o mesmo Pavarotti, mais moçoilo é verdade, dá um bis em pleno espetáculo...

Isso só é possível porque, no caso das óperas, as paixões são exuberantes.

Torcemos pelos personagens, torcemos pelos cantores, enfim, "pão e circo".

Algumas peculiaridades reforçam o que aqui escrevo.

Primeiro, por ser um espetáculo dirigido às massas, as óperas eram consideradas, por muito tempo, como descartáveis. Algumas milhares ficaram esquecidas e nunca mais foram representadas, noutras, partituras serviram para embrulhar lanche de muitos músicos.

Muitas, milhares de óperas não sobreviveram ao tempo. Não havia na ocasião a cultura para preservar a partitura das óperas encenadas. O julgamento era cruel. A ópera era boa, fazia sucesso e guardava-se a partitura. Se não fôsse boa, estava fadada ao esquecimento e sabe-se lá onde ficaram as partituras.

O libretto podia ser bom e a ópera, escrita sobre esse folheto, não. O que se fazia? Descarta-se a música, aproveitava-se o libretto...

Também houveram casos de se aproveitar músicas escritas anteriormente, pedaços é verdade, para novas óperas. Normal, embora não usual.

Outro compositor aproveitaria a mesma história, adaptaria um novo libretto e fazia uma outra ópera. Ainda poderia acontecer de, usar-se a mesma história e fazer-se outra ópera, ainda que a primeira tivesse tido sucesso.

Parece sina, citar a mesma obra, mas existe a Manon de Massenet (1884) e a Manon Lescaut de Puccini (1893). Ambas fizeram sucesso a seu tempo, ambas são representadas até hoje, a de Puccini tornou-se mais conhecida.

Obras de escritores famosos foram adaptadas para ópera, por exemplo, Macbeth e Otello de Shakespeare viraram ópera na mão de Verdi. Só que a trama foi simplificada em ambos os casos.

E isso era uma regra, tomava-se uma história, aproveitava-se o arcabouço e lá vinha o libretto com as modificações a gosto dos seus compositores. Algumas ficaram até melhores, outras...

Noutras acontecia de um compositor fazer uma ópera e outro fazer uma outra, baseada nos (quase) mesmos personagens, por exemplo, Mozart fez As Bodas de Fígaro (1786), Rossini fez O Barbeiro de Sevilha (1816). Ambas praticamente se calcam em personagens muito semelhantes.

As casas editoras tinham praticamente sob seu jugo os compositores. Contratos que ligavam este ou aquele compositor a esta ou aquela editora, eram tão decisivos na produção de óperas que eram como duas oponentes que se degladiavam em "lutas" de vida ou morte. Seus compositores também tinham que dançar de acordo. Encomendas se sucediam na mesma medida que obtinham sucesso, portanto, era melhor que se fizesse.

Rossini, por vezes acabava suas óperas no dia da sua estréia, às vezes, não houve nem ensaio. Algumas foram compostas em dias, algumas em semanas...

Houve caso de ópera onde o compositor, preso por dívidas, literalmente na cadeia, escrevia para um intermediário que, por sua vez levava as partituras, diretamente ao teatro. Preciso pesquisar quem foi, confesso que me foge à memória.

As torcidas, a claque... Cada teatro tinha a sua, vaiava no teatro oponente e aplaudia em seus teatros. Havia a claque dos artistas. Mesmo o menos dotado era aplaudido por seus "defensores" e apupado pelos "rivais". E tinham de ser muito bons para contar com o aplauso do resto do teatro.

O sucesso se media pelo número de récitas... Se fôsse um êxito, a peça era repetida dezenas de vêzes, se fôsse um fracasso... Tenho pena dos compositores.

No capítulo dos cantores, cada compositor tinha os seus preferidos, fazia a ópera pensando em determinado cantor. E a claque estava alí, para vaiar ou aplaudir intensamente. Não devia ser fácil a vida de artista...

Óperas que seriam encenadas na França, por exemplo, tinham uma parte que era um balé, composto especialmente para a obra. Don Carlo de Verdi, tem um balé enorme que era encenado na França mas, atualmente é omitido na maioria das apresentações.

Lugar chique na platéia? Não... Platéia era para o povo. Os finos da época assistiam de camarote, literalmente...

Como havia de se fazer o público se calar e se sentar, isso quando o povo ganhou cadeiras, as aberturas se tornaram populares. Enquanto a abertura se desenrolava é que os espectadores iam se arrumando para o espetáculo.

Houve uma época onde cada ária era aplaudida e portanto os compositores já construiam suas tramas de maneira a acomodar esses aplausos. Com o passar do tempo isso meio que se tornou mais difícil pois a ação se sucede sem aquelas pausas propositais.

Portanto, a próxima vez que houver oportunidade, venha sentir como ainda é êsse gênero artístico peculiar.

Não importa que a trama não faça muito sentido, não importa que o público aplauda seus ídolos interrompendo a ação em momentos apropriados, o que já está normalmente previsto. Cantores esperam aplausos e assobios entusiastas, o que é a consagração da obra, dos músicos, dos cantores, dos côros e dos maestros.

Tudo é válido nesse mundo de paixão. Hoje em dia se coloca até legendas na língua do país de execução. Um bom número de obras é cantado em masi de uma lingua. Há Don Carlo em Francês e há Don Carlo em Italiano.

Os musicais americanos, que sucedem em sucesso as óperas nesta segunda parte do século XX, estão aí para mostrar que, apesar de se destinarem a públicos mais abrangentes, herdaram muito do mundo mágico onde o espetáculo começa com o canto dos cantores.

Se algum de vocês notarem certa semelhança com algumas novelas da Globo, também não estão errados, não é mera coincidência. Cada geração tem a sua paixão por novelas. No caso a novela, na época, chamava-se ópera e era destinada ao grande povo.

De passagem menciono os shows de rock, não é familiar o que escrevi?

O que se vê hoje, na ópera, é uma certa elitização de reações, o resto, amigos, funciona exatamente da mesma maneira...

Bravo!!!!!!!!!!! FFFFiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiuuu!!!

Jacques

segunda-feira, abril 18, 2005

Como resolver problemas com a ajuda de um mágico




Um de meus ídolos tardios, não que não fôsse gênio muito antes de conhecê-lo, foi Richard Feynman.

Nascido em 1918, Richard Phillips Feynman nasceu em Manhattan, New York, Estados Unidos. Desde cedo se mostra um cientista nato. Colaborou no esforço de guerra, durante Segunda Guerra Mundial, no projeto Manhattan, para a construção da bomba atômica. Foi prêmio Nobel de Física em 1965, junto com Schwinger e Tomonaga. Sua contribuição à ciência é enorme. Ainda em 1986 participou da Comssão de Investigação sobre a explosão da nave espacial Challenger. Veio a falecer em 1988.

Como curiosidade, houve uma passagem sua pelo Brasil, no Rio de Janeiro, de agosto de 1951 a junho de 1952. Fez pesquisa e ensinou física na Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro).

O que fascina, apesar da estatura deste gênio, é a facilidade com que consegue passar ensinamentos, de uma maneira simples, para assuntos de alta complexidade.

Não temam, caros leitores, que eu vá me aventurar a colocar aqui nenhuma alta teoria matemática, nem ao menos nenhuma grande explicação científica. Apenas pretendo mostrar como raciocinava fácil o nosso mágico.

Digo mágico, porque o que li sobre Feynman, de seu livro (muito engraçado além de tudo) autobiográfico, "Surely You're Joking, Mr. Feynman", que aliás tive a grata surpresa de saber que foi traduzido para o português, sob o título de "Deve ser brincadeira, sr. Feynman", é de uma simplicidade que só pode ser atingida por sêres muito superiores, que, no entanto, sabem como transmitir ao próximo, seus conhecimentos.



Este livro é a ponta do iceberg que encanta aqueles que desejam conhecer como pensava esse físico, a um só tempo, um gênio e um mágico.

Entre os muitos problemas de que se ocupava Feynman, havia o princípio da mínima ação. Não nos ocuparemos da alta estratosfera teórica que circunda o problema. No entanto, para a alta complexidade de seu tratamanto, Feynman "bolou" uma analogia que encanta. Se não podemos nos alçar a altura de entender a alta teoria, vamos nos deleitar com a facilidade de seu raciocínio.



Imaginem que o salva-vidas, numa praia, percebe que há um nadador em dificuldades no mar. Existem três possibilidades para que ele atinja o nadador no mínimo de tempo.

Qual seria a trajetória a ser seguida? A 1? A 2? Ou a 3?

Por partes, se seguissemos a trajetória 1, é a trajetória, por terra, mais rápida, mas como a distancia no mar seria a maior, e a velocidade de natação é menor, o tempo para chegar até o nadador seria maior. Portanto fica descartada essa opção.

Restam-nos as outras duas opções. Iniciamos pela trajetória 3. Aí a stuação se inverte, o percurso por terra é maior, mas a natação tem seu tempo minimizado...

A solução 2 é um compromisso, nem o percurso por terra é muito grande e nem o percurso no mar é tão grande.

Aí caberá ao salva-vidas decidir. Se as distancias forem semelhantes, terra e mar, a opção 2 é a mais correta, se, ao contrário, o percurso a ser vencido na natação for relativamente maior, escolheríamos a opção 3, essa seria a opção a ser escolhida por ser a mais rápida...

Feyman usa essa analogia, simples demais, para ensinar o seu "Princípio da Mínima Ação" que explica muitos dos princípios de Física Quântica e assuntos tais como propagação, reflexão e refração de raios luminosos, partículas quânticas entre outras tantas partículas sub-atômicas.

Existem outras histórias curiosas e divertidas que envolvem Feynman e seus alunos. Muitas são antológicas. Entre seus livros para nós leigos, o livro aqui citado é uma leitura onde se sorri da primeira à última página. Aqui e alí daremos gostosas risadas. E viveremos o dia a dia de um cientista que tinha tudo para ser hermético mas que era simples demais. E se não era simples demais como cientista, era simples como ser humano.

Mas isso já é uma outra história...

Jacques

domingo, abril 17, 2005

Uma janela numa janela,um quadro dentro de um quadro


Transparent screen - felipemusica

A idéia é interessante. Como cheguei a esta foto? Já não me lembro. Passam tantas coisas em nossas telas de computador que a origem das coisas se perde.

Há algum tempo esse tipo de enquadramento de um assunto dentro de outro, corolário do que anteriormente escrevi, onde existem várias fotos dentro de uma única foto, faz-me refletir como somos limitados em nossa visão.


La condition humaine - René Magritte - 1933

A idéia aqui é oposta. A tela se contrapõe ao fundo. Enquanto a impressão que a primeira foto passa é de transparência, Magritte nos fala da opacidade. Ou seria vice-versa?

Portanto, mister se faz entender, toda nossa vida se passa em fases, de transparências e de opacidades.

Qual a postura correta? De que lado está a verdade? Não há como saber.

Há que discernir entre observar o todo e extrair partes e, também, somar partes para poder observar o todo.

Nenhuma posição é definitiva. Minha visão pode ser diferente da sua. Minha posição hoje, pode evoluir para outra mais à frente. Hoje divergimos, amanhã convergimos. É um processo dinâmico, não há regras estritas.

Interessante...

O segredo está em respeitar a posição do próximo. Respeitar para ser respeitado. Isso diz respeito a todos nós.

Jacques

Já que os peixes não estão mordendo a isca, falemos de ópera...

Sentido figurado...

Passei o dia fazendo minhas contas com o Leão. Aí coça que coça a cabeça, olha para o blog meio desenxabido, meio de esguelha e falar do que?

Outro dia disse que iria falar sobre algumas curiosidades, sobre o mundo da ópera, certo? Pois é!

Não tenho pretensões, meu conhecimento é parco. Apenas acho que existem certas peculiaridades, ligadas à ópera, que são interessantes para compartilhar. Aviso aos caros leitores, nada do que vai aqui escrito tem o rigor do músico, escrevo como simples diletante e melômano, audácia dos que pouco sabem e porisso tenho humildade para reconhecer o quão pouco tenho a falar. Mas audácia é audácia e vamos em frente.

Premissas colocadas, passemos ao discurso.

Primeiro, vamos falar apenas a respeito de curiosidades, que isso não pressupõe um rigor temporal. Portanto, se começamos pelo meio, voltamos ao início e depois vamos um pouco mais à frente, peço que me perdoem. Minha intenção é falar à solta, deixar uma trilha marcada que poderá ser retomada, para frente e para trás.

Existem, na ópera, convenções próprias do gênero. Ópera pressupõe música e canto, além da representação, é claro...

Só que, por hoje, deixaremos a representação para um segundo plano. A representação hoje é secundária, ao menos a parte visual. Façamos de conta que estamos ouvindo um CD de uma ópera.

Temos os cantores e a orquestra. Música maestro!

O nosso maestro inicia sua ópera e em dado momento os cantores começam a cantar. Estamos em meio a uma ária. Ária é o trecho onde um ou mais cantores cantam, fazendo solo, dueto, terceto, quarteto... O côro pode ou não estar presente.

Primeira constatação, a música precisa de um tempo para desenvolver-se. Um acorde, uma série de notas vai sendo tocada e aos poucos vai se organizando até que começa a criar um impacto. O seu "discurso" não é o de uma, duas ou mais pessoas conversando, é claro. Portanto, nas árias aquilo que aparentemente levaria meia dúzia de palavras para dizer, demoram um tempo consideravelmente maior.

O desenvolvimento da música requer forma e um balanço, vai e volta, retorna, repete, sobe de tom, volta ou qualquer outra seqüência que seja válida. Isso não é apenas na ópera. Vale para todos os gêneros musicais. Há o refrão, o estribilho, há a repetição, enfim, nada de novo, desde a cantiga de roda até o samba, todos os rítmos seguem um padrão mais ou menos constante.

Como na ópera isso normalmente é acompanhado de variações, antecipações de temas, revisões, pausas para que a ação se desenrole, antecipações de situações que aparecerão mais à frente, a cena se estende bem mais.

Raramente o que é dito com meia dúzia de palavras é assim interpretado. É preciso criar um clima, um efeito.

Por todos esses motivos, normalmente, quando uma ária se inicia, a ação dramática no palco, quase que se imobiliza. É aqui que acontecem coisas do tipo que anteriormente citei, e aqui repito, um herói ou uma heroína, que foram apunhalados, que receberam um tiro, ou de alguma maneira estão mortalmente feridos, ou calmamente entregando suas almas, cantam por vários minutos, o que requer muito fôlego, antes de expirarem.

Às vezes acontece até o inverso.

Poderia citar um exemplo, Gilda, ao final do Rigolleto, ferida de morte por Sparafucile, o assassino, que, no escuro, pensando que ela fosse o Duque, a coloca num saco que entregará a Rigoletto. Nesse momento, o mais emocionante e comovente da ópera, Rigoletto, exultante com o suposto corpo do sedutor de sua filha (Gilda), escuta o Duque dentro de uma taverna cantando "La Donna è Mobile", rasga o saco e descobre o corpo de sua amada filha.

É nessa hora que Gilda (morta), começa a entoar um canto de despedida e pede perdão a seu pai, Rigolleto, por estar no lugar do Duque. Verdi e seu libretista, Piave, sentiram que Gilda teria que "sobreviver" o tempo necessário para que a música desse o devido peso ao trágico desfecho. A melodia é inesquecível.

Realisticamente, ela já estava morta quando Rigolleto abre o saco.

Suficiente como exemplo. É uma das cenas mais lindas que conheço mas certamente nossas crianças, bem mais diretas, não entenderiam nada disso. Nos desenhos animados, o fato é direto, atirou, caiu e morreu. Nas historinhas que nos contam, acho que o único paralelo, é o da Avózinha do Chapéuzinho Vermelho, que é salva da pança do Lobo Mau...

Outra peculiaridade da ópera, a repetição do texto, em sí, nada dramático. Ouvintes que porventura estiverem acompanhando o texto, no libretto, ficarão espantados de ver que quatro linhas de verso podem se alongar por dez minutos, às vêzes mais...

A melodia vai se repetindo, vai evoluindo, vai se tecendo, se desenvolvendo, às vêzes voltando e recomeçando, enfim a linguagem da música exige esse tipo de malabarismo estético. E é o próprio ouvinte que avalia e quer as palavras se repetindo para ouvir a melodia, a música. Essa repetição, contrária ao senso ou não, deixa de ser importante se a música penetra em nossas mentes e nos emociona.

É o efeito que os nossos compositores desejam e que nós, ouvintes, ansiamos.

Acho que, para um fim de sábado e comecinho da madrugada de domingo, é o bastante...

Da próxima vez que ouvirem uma música, qualquer gênero, vocês vão identificar essas nuances, comuns é verdade, mas que estamos tão acostumados que nossas mentes nem param para analisar.

Pessoal, o peixe que é bom, nada... Resta saber se eu vendi o meu peixe.

Boa noite para quem é da noite, bom dia para quem é do dia!

Jacques

sexta-feira, abril 15, 2005

Lado alado...

Hoje dei para brincar com as palavras.

Só quem mora em São Paulo conhece o gosto de ter de sair de casa com o carro após as 10 da manhã e estar de volta antes das 5. Não é esse o meu tema de hoje.

Palavras... Podem ser doces, podem ser salgadas, podem ferir, podem curar, podem ser mortais, podem ser imorais, podem... Tudo pode!

O caso do zagueiro do Quilmes, está em todos jornais. Meras palavras? Não, não... São as palavras proferidas "no calor da batalha" para desestabilizar um adversário? Mais uma vez não. Foram palavras usadas para ferir, humilhar...

O que no seu país não é crime, aqui é.

A discriminação racial é degradante. Não posso dizer que nunca aconteceu comigo. Aconteceu. E é uma sensação muito má. Acredito que alguns aprenderão a lição. Outros, infelizmente, se acham mais poderosos do que a lei e mais, que o braço da lei é curto para alcançá-los. Um dia esses sofrerão na carne o escárnio de seus atos.

Espero que os jogadores de futebol e as torcidas aprendam a lição. Mais, que cada cidadão mire-se profundamente no espelho e questione-se sobre esses acontecimentos. Está em nossa mãos fazermos uma humanidade mais unida, mais integrada e mais justa.

Já passei por um aperto, nada semelhante claro, quando há cerca de uma ano dirigia numa estrada do Colorado. Não percebi o limite de velocidade. Logo em seguida, aquela cena que está em muitos filmes, um carro de polícia, a sirene, a ida ao acostamento, a identificação... Resumindo, o xerife deu alí mesmo a sentença. Como eu era estrangeiro, fui condenado, alí mesmo, a uma admoestação verbal de quinze minutos...

E tem mais, durou exatos quinze minutos. E o discurso tinha nexo. Lei é lei... E depois disso recebi os votos de boa viagem, deste simpático cidadão, zeloso guardador da lei e da ordem, Mr. T. H., de Dolores County, Dove Creek, CO, Sheriff´s Office. Aprendi minha lição. Guardo o cartão até hoje. Omito o nome do cidadão porque, tenho certeza, não estava a procura de fama.

Mas, falava eu do exaspero que é agüentar até as 10... Saí um pouco antes e passei numa livraria que existe lá perto de casa. Tinha vinte minutos para mim.

Passeei pelas estantes, folheei livros, voei como um pássaro. Esqueci-me do rame-rame do dia-a-dia, esqueci do rodízio, entrei em estado de meditação pura.

Como, apesar de muito badalada, era cedo, havia pouca gente. Tomei um cafézinho, quando aprendi português grafava-se cafèzinho, em todo caso naquela época não era o expresso, o tipo italiano, era o de coador mesmo. E o café estava ótimo!

Passei pelos livros de fotografia... Pelos de aquitetura, que saudades... Tinha uma edição comemorativa do Don Quijote de La Mancha, edição comemorativa dos 400 anos, editada na Espanha... T.S. Elliot, em tradução comparada, inglês e português...

Passei pelos livros de culinária, passei por um cujo título me chamou a atenção, O que Einstein disse a seu cozinheiro, ou algo parecido, não me lembro o título direito, mas o assunto era tecnologia alimentar.

Pude sentir o peso dos livros, sentir o cheiro do papel recém impresso... Na secção infanto juvenil vi Jules Vernes, Vinte Mil Léguas Submarinas, em francês. só acho que vai passar um tempinho até esse livro encontrar o seu dono.

Sim, porque os livros lá estão escolhendo seus donos, seus leitores. Um pouco como os gatos, que deixam que pensemos que somos seus donos mas, em realidade, são eles que nos escolhem, seus animais de estimação somos, nós...

Viajei a mil... Um telefonema no entanto, me fez ficar pensativo, só escutei um lado da conversa, portanto intuo o outro lado. Resumindo, um autor, ou autora, querendo saber quantos e se alguns livros haviam sido vendidos, pois eram consignação. O que me deixa pensativo, qual o sacerdócio em editar e publicar um livro e depois ter de se preocupar com a venda, consignada, por sinal. A livraria não corre riscos... Vida dura!

Voltando a meus devaneios, um livro de fotografias de São Paulo, edição comemorativa dos 450 anos dessa nossa mégalo-acéfalo-paquidérmica-metrópole... Livros de botânica, um sobre ervas medicinais, lindo, mas quando é que iria me dedicar a estudá-las?

No capítulo das palavras, me lembrei de um professor de Português, lá na quarta série do ginásio, que dizia gostar de mulheres petulantes, abundantes e pernósticas... Gostava das frases de efeito. Muito preconceituoso. Muito espirituoso. Hoje estaria enquadrado em algumas leis, provavelmente, mas que eram engraçadas suas aulas, lá isso eram. O nome me sumiu, mas suas aulas perduram...

Minha viagem ao mundo gráfico continuou por mais algumas estantes... Cheguei à conclusão, falta-me tempo para adquirir o acêrvo que cabe na minha cabeça, que quero, mas que não cabe no tempo que me resta. Conto com uma certa ajuda Divina para que eu possa ler muito ainda do que ainda quero. Oxalá!

Aí ví o último livro do Gabriel Garcia Marques, no original, aí não resisti... Aí já era demais. A César o que de César. Comprei! Memoria de mis Putas Tristes...

Meu vôo, começado trinta minutos antes, estava chegando ao fim... Mas ficou o sabor do café, o cheiro da livraria, as cores dos livros, a paz dos que têm prazer em folhear um livro e a capacidade de sonhar de olhos abertos, um espaço abriu-se em meu cérebro e que andava ocupado com pequenos problemas que deixaram de ser, outras tantas fotografias que mentalmente ando tirando, algumas que ainda vou lembrar de levar a máquina para apertar o botão, outras ficarão somente em minha memória.

Minha mente tinha alçado vôo, esperançada de continuar nas nuvens, talvez não mais pousar...

Jacques

Au fond du temple saint (link para a música)

Tentei, diversas maneiras de colocar o próprio arquivo (mp3) da ária Au fond du temple saint aqui no blog.

Parece que está acima da minha capacidade colocar o arquivo aqui. Eu sou novo, ainda tenho muito a aprender.

Porisso deixo aqui o link:

Au fond du temple saint


Apenas deixo como conselho, se gostarem, gravem em seus HDs, não creio que o link seja muito confiável.

Jacques

quinta-feira, abril 14, 2005

Au fond du temple saint (tradução)

Segue abaixo a tradução livre da ária, em português

Ao fundo do templo sagrado


NADIR
Ao fundo do templo sagrado
Ladeado de flores e de ouro,
Aparece uma mulher!
Eu creio ainda a ver!

ZURGA
Aparece uma mulher!
Eu creio ainda a ver!

NADIR
A multidão prosternada
Olha para ela, espantada,
E murmura em voz baixa:
Vejam, é a deusa!
Que na sombra se veste
E para nós estende os braços!

ZURGA
O seu véu se levanta!
Ó visão! Ó sonho!
A multidão se ajoelha!

NADIR e ZURGA
Sim, é ela!
É a deusa mais charmosa e mais
Bela!
Sim, é ela!
É a deusa que desce entre nós!
Seu véu se levanta e a multidão
Ajoelha-se!

NADIR
Mas, através da multidão
Ela abre uma passagem!

ZURGA
Seu longo véu já
Nos oculta seu rosto!

NADIR
Meu olhar, que pena!
A procura em vão!

ZURGA
Ela se foi!

NADIR
Ela se foi!
Mas dentro de mim de repente
Que estranho ardor se acendeu!

ZURGA
Que novo fogo me consome!

NADIR
Tua mão repele minha mão!

ZURGA
Tua mão repele minha mão!

NADIR
De nossos corações o amor pulsa
E nos torna inimigos!

ZURGA
Não, que nada nos separa!

NADIR
Não, nada!

ZURGA e NADIR
Juremos ficar amigos!
Ó sim, juremos ficar amigos!
Sim, é ela! É a deusa!
Que hoje vem nos unir,
E fiel à minha promessa,
Como um irmão, eu quero cultivar!
É ela, é a deusa
Que hoje vem nos unir!
Sim, partilhemos este (mesmo) arranjo,
(Que) Sejamos unidos até a morte!



Compartilhem comigo esta pequena obra-prima!

Jacques

Bizet e a pérola escondida



Quando ia iniciar esse texto, pensei em colocar como pano de fundo uma ária dessa maravilhosa ópera.

Depois cheguei à conclusão de que uma música de fundo pode ou não ser agradável. Também pode ser conveniente ou inconveniente. Optei por colocar a primeira página da partitura de uma das árias mais puras que conheço, Au fond du temple saint, da ópera Les Pêcheurs de Perles.

Bizet viveu muito pouco tempo. Morreu com 36 anos. Sem dúvida sua ópera mais famosa foi Carmen.

Bizet tinha 25 anos quando escreveu essa pequena obra prima, Les Pêcheurs des Perles, a história é singela.

Trata-se da história do amor de Zurga, o chefe dos pescadores de pérolas, e seu amigo Nadir, também um pescador de pérolas, por uma sacerdotisa, Leila.

História mais simples impossível. Assim como é impossível na vida real, dois amigos apaixonados pela mesma mulher, consensualmente.

É lógico que não nos cabe aqui discutir essa relação dúbia entre personagens da trama da ópera. Assim como boa parte dos librettos de ópera, uma série de acontecimentos, e como são tratados tais acontecimentos, são próprios de um código, que se aplica tão somente às óperas, mesmo assim, isso varia de acordo com a época em que as óperas foram escritas. As histórias podem distanciar-se da realidade. por isso são óperas e, portanto, como tal devem ser tratadas.

Uma das curiosidades, entre outras, é o fato de, em algumas óperas, o "morto" continuar cantando após seu assassinato. Depois desse último canto, onde perdoa seu assassino, por exemplo, entre tantos outros motivos que justificam seu canto, tomba e se cala. Prometo que voltarei ao assunto. É um tema muito interessante.

A primeira apresentação da ópera foi no Théatre Lyrique de Paris em 1863, no dia 30 de Setembro.

O libretto, a quem cabem a autoria do texto que vou reproduzir abaixo, é de Michel Carret e Eugène Cormon.

Au fond du temple saint

NADIR
Au fond du temple saint
Paré de fleurs et d'or,
Une femme apparaît!
Je crois la voir encore!

ZURGA
Une femme apparaît!
Je crois la voir encore!

NADIR
La foule prosternée
La regarde, etonnée,
Et murmure tous bas:
Voyez, c'est la déesse!
Qui dans l'ombre se dresse
Et vers nous tend les bras!

ZURGA
Son voile se soulève!
Ô vision! ô rêve!
La foule est à genoux!

NADIR ET ZURGA
Oui, c'est elle!
C'est la déesse plus charmante et plus belle!
Oui, c'est elle!
C'est la déesse qui descend parmi nous!
Son voile se soulève et la foule est à genoux!

NADIR
Mais à travers la foule
Elle s'ouvre un passage!

ZURGA
Son long voile déjà
Nous cache son visage!

NADIR
Mon regard, hélas!
La cherche en vain!

ZURGA
Elle fuit!

NADIR
Elle fuit!
Mais dans mon âme soudain
Quelle étrange ardeur s'allume!

ZURGA
Quel feu nouveau me consume!

NADIR
Ta main repousse ma main!

ZURGA
Ta main repousse ma main!

NADIR
De nos cœurs l'amour s'empare
Et nous change en ennemis!

ZURGA
Non, que rien ne nous sépare!

NADIR
Non, rien!

ZURGA ET NADIR
Jurons de rester amis!
Oh oui, jurons de rester amis!
Oui, c'est elle! C'est la déesse!
En ce jour qui vient nous unir,
Et fidèle à ma promesse,
Comme un frère je veux te chérir!
C'est elle, c'est la déesse
Qui vient en ce jour nous unir!
Oui, partageons le même sort,
Soyons unis jusqu'à la mort!

Sei que provavelmente a maioria dos leitores não domina o francês. Uma tradução está a caminho. Certamente não será nem literariamente perfeita e nem fará justiça ao original, mas certamente é um texto bonito.

Também está em meus planos fornecer um link para que vocês possam apreciar a beleza deste trecho.

Jacques

quarta-feira, abril 13, 2005

Um depoimento

Ontem, ao brincar a respeito de meu amigo Sir Ivanhoe Cedric Quaff e suas trapalhadas, omiti a parte onde Lady Skimbleshanks imagina o primeiro fumando cachimbo.

A verdade é que, contando a história de trás para frente, a última vez que fumei cachimbo foi em 8 de Maio de 1988. Coloco aqui a minha experiência própria em deixar de fumar por achar que esta possa ser útil àqueles que como eu tenham chegado à conclusão que é hora de parar.

O começo, como sempre, é banal. Vontade de me sentir adulto, imitar os mais velhos, sentir-me como um cáuboi no meio de um saloon com toda aquela fumaça, conquistar as mocinhas e por aí vai.

Acontece que aquele esforço para parecer tão fashion tem o seu preço. Eu já vinha notando uma grande falta de fôlego, um mal estar interno que só fazia aumentar minha dependência ao fumo, minhas crianças cheiravam mal, assim diziam meus amigos, em outras palavras, é claro...

Aí, ao dobrar o Cabo da Boa Esperança pela primeira vez, o dos quarenta anos, resolvi fazer um checkup. Tornando curta uma história, meu médico, após um pífio trezentos metros na esteira ergométrica, me avisou, se quiser mais tempo de vida, deixe de fumar. Isso foi lá por Fevereiro do mesmo ano.

Resolvi fazer, por conta própria, usar a velha receita, se pifei com trezentos metros é por falta de preparo físico, vou começar a andar. Anda que anda e eu só fazia o papel de Don Quixote, o Cavaleiro da Triste Figura...

Não conseguia andar mais do que umas poucas quadras, no plano, claro, e morria após o esforço.

Já haviam se passado dois meses e o resultado de meu exercício era muito lento, praticamente nulo, eu diria.

Dia da Vitória, 8 de Maio, ao ver um documentário na TV Cultura, senti um mal estar tremendo, físico e mental. Afinal o que eu queria da vida? Viver ou entregar minha pobre alma prematuramente?

Optei por terminar de dar minhas últimas baforadas no cachimbo. Não externei a ninguém minha decisão tomada alí sem maiores pensamentos. Pensei comigo, vou continuar a levar meu cachimbo, meu fumo e meu isqueiro por algum tempo. Se sentir vertigens, se achar que vou morrer, se minha força de vontade faltar, se vier a desfalecer, volto a fumar.

Pois bem, carreguei comigo, durante um mês, toda tralha. Fui forte. Acho que nunca precisei ser tão forte. Me senti um adulto pela primeira vez em anos...

Não pensem que tenha sido fácil. Não foi!

Mas a força de vontade, a determinação e a minha vontade prevaleceram.

Pensei que iria engordar. Não engordei! Por que? Porque coloquei na minha cabeça que iria recomeçar a minha vida, mais sadio!

Coloquei na minha cabeça que daquele ato, deixar de fumar, dependia minha saúde. Comecei a andar, aos poucos, mais e mais distancia.

Contratei um técnico para me acompanhar no reaprendizado. O dia que consegui "correr" os meus primeiros trezentos metros, chorei! Aos poucos fui progredindo, um quilometro, dois... Aí passei a correr por tempo, 30 minutos, aumentei até uma hora. Já percorria boas distancias em velocidades bem baixas, mas minha saúde melhorou.Já conseguia conversar enquanto corria. Tornei-me um outro homem.

Não é o caso de ficar analisando cada conquista que fiz, o que posso dizer é que, quando corri uma maratona, meu filho correu comigo os últimos 195 metros, muita emoção! Chorei que me acabei!

Eu havia corrido quarenta e dois quilometros sozinho! Verdade que já havia decorrido sete anos entre minha decisão e o dia da maratona. Mas valeu cada metro! E os últimos metros na companhia de meu filho... Não dá para traduzir em palavras, eu realmente sou um homem muito feliz!

E tudo isso eu devo àquele Dia da Vitória, que foi também a minha!

Este é o meu depoimento pessoal. Eu fiz a minha parte. O Criador me ajudou e me inspirou! E meu filho me coroou! Eu passei a ser um ex-fumante!

Jacques

PS: Não tenho postura de chato, se os outros querem fumar, não é meu problema. Não faço da minha experiência uma catequese, cada um deve decidir pelos atos que pratica e arcar com as conseqüencias. Meu depoimento só tem a intenção de ajudar! Espero que ajude!

terça-feira, abril 12, 2005

Carta entre amigos

"Minha cara Lady Skimbleshanks!

Que prazer receber sua carta hoje!

Clington, meu mordomo, perdeu-se ao ir até a porta do Castelo e eu quando recebi a sua carta não consegui abrir o envelope, tinha tomados uns whiskys a mais...

Só bem mais tarde é que fui ler. Não posso deixar de responder suas amáveis linhas...

Para facilidade, transcrevo aqui, parte de sua missiva:

"Admiro a cultura alheia com todo o meu ser! como amo a cultura, em todas as suas manifestações! Em você, Ivy, revisito minha visão daquele Lord, de chambre, fumando cachimbo (ok, já sei!!!), ouvindo ópera bem alto no seu castelo, ao entardecer, ao pé da lareira...Ou então caçando raposas...if you know what I mean! Ou, ainda, em Veneza, sentado num café com um livro nas mãos, o olhar distante...talvez admirando o perfil de uma chiezza qualquer...ou, quem sabe aquele schollar, lendo uma pilha de alfarrábios numa língua longínqua e exótica, hindu, aramaico...
A cultura alheia... porque eu me vejo um ser inacabado, ou mal-acabado. Faltou concentração, eu me dispersei no caminho. Sério. Enfim... c´est la vie!"

Bondade sua, minha cara!

Desde que meus antepassados mudaram-se para o Quaff´s Castle muita coisa mudou, cara Skimbleshanks...

Primeiro tive que vender parte de minhas propriedades porque as raposas resolveram se mudar para terras mais calmas.

Por essa ocasião, ainda via por aqui a pequenina Elisabeth que aqui vinha passar parte de suas férias. Depois, pouco a pouco vi minguarem meus recursos e tive que vender outra parte da minha propriedade.

O Quaff´s Castle antes parte de um área totalmente dedicada à caça das raposas viu minguar seus recursos com essa lei passada esses dias no Parlamento proibindo esse esporte realmente nobre. O que os meus pares vão fazer? Com que vão se divertir? Deviam deixar de se preocupar conosco, sabemos muito bem nos cuidar...

Mais, com a venda da maior parte da propriedade, acabaram-se as festas e os amigos foram rareando.

Hoje, com meus recursos em baixa, vi-me obrigado a dispensar todos os empregados do Castelo, restando apenas Clington, o mordomo, e eu.

Ora, Clington sofre com o reumatismo e sua memória. Eu, minhas pernas andam fracas. Já não viajo mais como antigamente. Já não sou mais convidado para aquelas viagens em que a comitiva fazia a diferença. Bons vinhos, boa comida, boas companhias...

A comida por aqui também anda muito fraca, porridge no desjejum, porridge com torta de rim no almoço e torta de pombo com porridge no jantar...

Mas tem o lado bom da história, uma vizinha minha, vem aqui tomar o five o´clock tea de vez em quando. Traz uns docinhos muito gostosos e nesse dia não tem porridge...

Aqui, o Clington e eu, vivemos como gato e rato. Ele esconde a garrafa de whisky e eu acho. Aí eu escondo e ele acha... E assim vamos vivendo...

Acho que o pessoal lá de Buckingham anda meio esquecido de mim. Está certo que o menino Charles deve andar meio miope, aquela Duquesa da Cornualha não é lá essas coisas, mas daí a não me mandarem convite...

Ou vai ver que o Clington confundiu os envelopes, pensou que era a de um Lorde amigo meu (era...) a quem eu devo uma alta soma em libras esterlinas e jogou fora o envelope...

Quanto ao meu robe de seda, acho que já conheceu dias melhores... Temo que vou sobreviver a ele...

Minha biblioteca ainda me consola, tenho muito o que ler, quando não bebo, é verdade...

O clima ainda está frio e há muito que não a calefação não funciona, apenas a lareira e o whisky aquecem os meus ossos.

Pois é, Lady Skimbleshanks, ergo um brinde à sua saúde! O sol já vai se por e a luz já não permite escrever!

Cheers!

Ivy"




Cometo a indiscrição de traduzir a carta de meu amigo Sir Ivy, que já conheceu dias melhores, que é um otimista inveterado e um ótimo copo!

Jacques

segunda-feira, abril 11, 2005

Não são só os neurônios...

Hoje pela manhã, ao chegar no meu escritório, me dei conta de que não são só os neurônios que são afetados pelo stress.

Acho que os duendes andam à solta quando os humanos não aparecem para cuidar dos computadores.

Muitas vezes, ao retornar de um fim de semana, o computador A desligou e recusa-se a ligar. Coisas de Eletropaulo, certamente. Não vou aborrecê-los ao lhes contar quais são os cuidados que tomo para que tal não aconteça.

Acontece, é o que importa. No último mês duas fontes pediram ou melhor se despediram. Ainda falta procurar uma que não é padrão. A outra, assim que der, passo numa loja de micros e dou um basta na desumana fonte que deu seu último suspiro sem me dizer adeus.

Não fique triste, são apenas peças de uma engrenagem à qual nos submetemos por necessidade.

Esse fim de semana foi mais dramático. Tenho um sistema que controla alguns computadores com apenas um mouse, um teclado e um monitor. Coisa prática que evita um monte de fios e um monte de liga-desliga, troca-destroca, além de economizar alguns bons trocados em periféricos caros como é o caso de um monitor...

Mas como eu ia dizendo, cheguei, dei uma olhada na correspondência e fui tratar de ver mais algumas coisinhas em outro micro.

Nada. O dito KVM, que é o nome da caixinha que faz a mágica de trocar as CPUs, me disse "não!". Não troco de computador. Ponto.

Ainda tratei de negociar, chequei cada cabo, tentei umas soluções mais drásticas, tipo desligar e religar todos os computadores e nada...

Quando surgem esses problemas insolúveis é melhor tratar de outros assuntos e depois voltar, quase sempre isso areja as idéias e traz soluções não tentadas anteriormente.

Fui cuidar do meu carro, que como disse ontem, tomou uma trombada. Vai daqui e vai dalí, parece que tomei a decisão certa, tomara...

Almoço que ninguém é de ferro. Volto a tentar os passos normais para conserto do KVM. Nada!

Liguei para dois fornecedores e pedi orçamento para um novo KVM. Um disse que ia mandar e não mandou. Outro disse que queria mais detalhes para mandar o orçamento e também não mandou. Aí é caso de falha humana, o Tico e o Teco não se comunicaram.

Aí comecei a notar uns detalhes, o teclado não tinha algumas letras, sinal de alerta que alguma coisa (corrente) passou pelos miolos eletrônicos do KVM.

Fácil, desligo, ligo e pronto... Já fiz isso algumas vezes. Acontece que não acontece nada. Pronto, já sei! Troco o telhado, digo o teclado, e parto para o abraço...

Nem telhado e nem o teclado. Agora eram outras letras que faltavam... Mais um terceiro e nada. Agora é uma outra série de letras que não estão presentes...

Então, pensei, vai na marra, teclado direto no micro... Não, o micro protestou. As mesmas letras faltando. Conclusão, teclado ou ainda pior, placa-mãe?

Para encurtar, peguei um teclado velho e "quebrado". Conectei no KVM.

Sei lá! Mil coisas.... E não é que tudo está funcionando! Vou é limpar o teclado que está com uma camada de pó que começou a assentar há alguns anos.

Pelo que estou batucando, não falta nenhuma letra...

Pois é, coisas que a razão não explica...

Jacques

domingo, abril 10, 2005

De pichação, de cidades e de corpos.

Domingo, dia de descansar, não é?

De andar por perto de nossas casas, de visitar parentes, de carregar baterias para mais uma semana.

Há dias que as coisas não correm exatamente como esperamos. Ao fazer essas atividades que todos gostam, as vêzes somos surpreendidos pelo imponderável.

Estava parado, esperando a abertura de um sinal, quando o carro que vinha atrás de mim simplesmente não freou. Por aqui termino o relato porque amanhã é que vou saber o tamanho do prejuízo.

Quem manda eu estar parado naquela hora, no local certo e no momento errado? Descrever os danos? Não é o caso. Amanhã é que vou começar a me preocupar.

Agora, por falar em danos, volto ao assunto sobre o qual eu queria discorrer.

Não é de hoje que, observador do cotidiano que sou, adoro a cidade que vivo e vejo a destruição gráfica dessa nossa querida cidade. Não sou especialista no assunto, não entendo de "tribos", não entendo de arte no sentido que muitos de nossos concidadãos acham que nossa cidade deve ser brindada.

Para mim, pichação é crime! Que prazer sádico deve existir na mente desses mentecaptos urbanos para emporcalhar nossas cidades com grafismos psicóticos? Que prazer mórbido deve convalidar essa agressão à propriedade alheia? E por alheia entenda-se duplamente, a privada e a comunitária!

Grafismos herméticos, caligrafia tribal, locais vigiados, locais inacessíveis, o perigo, a emoção (que emoção?), tudo é desculpa...

Deve haver alguma explicação para o tamanho do prejuizo. Apenas me escapa qual seja essa necessidade que move hordas de pessoas que destroem a cidade onde vivem, apenas para dar vazão a essa sanha insana.

Não há policia que coiba tamanha chusma de depredadores urbanos. Alguma coisa há de se fazer. Não sei realmente qual é o ponto fraco, onde atingir esse inimigo urbano. Será que ninguém vê? Ou será que ninguém quer ver?

E a meia dúzia que é flagrada enquanto dá vazão a essa destruição da propriedade comum? Será que é punida? Será que a pena redime? Será que não há reincidência?

Gostaria de saber todas essas respostas.

Mas, há ainda, uma outra "mania" atual que muito me preocupa.

A tatuagem. Enquanto existem os que causam danos a suas cidades, existe uma nova mania que grassa em nossa população.

De início, restrita a algumas raras camadas do povo, notadamente marinheiros e populações carcerárias, a moda hoje atinge todos os extratos de nossa população. Não posso considerar isso um fenômeno local pois, há muito, venho notando uma tendência mundial à disseminação dessa "arte" desfigurativa.

Certamente haverá muitos que discordarão dessa minha assertiva.

Estes argumentarão que cada um usa a liberdade individual para fazer o que quizer com o corpo. De certa maneira acho até procedente a livre expressão individual.

Não sendo eu obrigado a fazê-lo, perguntarão alguns, porque deveria eu expressar a minha posição contra as tatuagens?

Acho que, pichar a cidade e tatuar o corpo, são manifestações que visam agredir aqueles que como eu, vêm nesses atos mais semelhanças do que diferenças temporais.

Como judeu que sou, não posso esquecer que a tatuagem, na parte interna do antebraço esquerdo, era como os nossos irmãos (eram judeus, ou ciganos, ou homossexuais entre outras minorias "indesejadas") eram identificados pelos nazistas, quando entravam como prisioneiros em campos de concentração, trabalhos forçados e "pesquisa científica" eram destinos comuns, sofrimento físico e sofrimento mental dia após dia, semana após semana, até a morte que os libertava ao custo da própria vida, se é que aquilo que sobrou aos que sobreviveram possa ser chamada de vida. Seqüelas físicas e mentais, foi o que restou desses farrapos humanos.

Só quem conviveu com esses sobreviventes, quem já conversou com qualquer desses seres humanos, cujo único "pecado" e crime, era o de pertencer a algumas minorias discriminadas, eram submetidos a todo tipo de humilhações e privações, inclusive a de serem marcados como gado. Isso quando não iam direto para câmaras de gases, pelotões de fuzilamento ou exterminados bárbara e sumariamente.

E para dizer pouco, alguns deles sobreviveram à barbárie, a maioria pereceu antes que o suplício mundial se acabasse. Nunca fizeram alarde, nunca se postaram agressivos perante aqueles que os desgraçaram, nunca fizeram apologia do que quer que fosse, queriam apenas viver da melhor maneira possível aquilo que lhes restou após esses inomináveis sofrimentos a que foram submetidos. Eram e são, verdadeiras lições de vida. Sobreviveram ainda que tivessem sofrido na carne os efeitos do que é ser tratado como sub-humano. E no entanto, numa lição de vida, tornaram-se tão fortes que sobreviveram ao suplício inflingido.

A pichação e a tatuagem, a agressão ao bem público e privado, a agressão a sí e a seus semelhantes, tudo isso é profundamente lamentável.

Quanto à pichação, há de se esperar que nossas autoridades encontrem um remédio eficiente para que nossas cidades possam se curar dessa agressão comunitária.

Quanto às tatuagens, rezo para que a moda passe, rezo para que essa deformação visual de corpos não deixe seqüelas nessa jovem população que aprecia hoje essa agressão, que, se não agride aos que a ela recorrem, agride aqueles que tiveram entes queridos, conhecidos ou pessoas que pertencem a seu círculo, aprisionados, mutilados e ainda pior, mortos em nome de uma causa paranóica.

Com que olhos, daqui um tempo razoável, digamos, umas dezenas de anos, essa população olhará para seus braços, suas pernas, e mesmo aqueles que as colocaram em locais onde não vêm, a não ser no espelho, verá essas fúteis manifestações de "moda"?

Que eles nunca tenham em seus pensamentos o peso de uma geração que passou por uma agressão inominável, que eles nunca se arrependam da agressão a que se auto impuseram.

E que a moda da pichação se esvaia e que nossas cidades curem-se dessas mutilações auto infligidas. Sem mais recaídas...

Jacques

sábado, abril 09, 2005

Meus livros, meu orgulho! E algumas árvores no meu caminho...

Tem gente que não liga para livros, tem gente que nem tem livros.

Sempre que vou visitar a casa nova de um amigo, faço o "tour", normalmente pelas mãos da dona de casa, que vai discorrendo: -"Aqui é a sala, aqui é o nosso quarto, aqui fica o nenê, aqui é o canto de bagunça do mais velho, aqui é a sala de televisão"...

O tour sempre é variado, mas nunca varia, deu para entender? Assim é...

Sempre fico curioso, onde estão os livros? Pois é! Quase sempre não há... Quando muito três livros (provavelmente ganhos) de fotos, um livro sobre o Ayrton Senna, uma Bí­blia... ainda faltaria um para meia duzia.

Eu, ao contrário, rato de livros, tenho uma bibblioteca que cresceu comigo. Livros sempre foram meus companheiros inseparáveis. Eles se amontoam em todos os cômodos da casa, nas estantes, sobre as mesas, apinhados em armários e gavetas, enfim, para onde olho, lá estão meus inseparáveis amigos.

Sempre que posso vou parando em livrarias. Nunca tenho í­mpetos de consumista, sou um consumidor moderado de quase todos os tipos de livros (e discos, CDs e DVDs). Folheio um aqui, outro alí­ e nem sempre levo, dor de consciência talvez. Tem uma pilha que ainda não li, mas não tenho pressa, vou saboreando as capas, vou lendo numa ordem diferente da que comprei, não há regras.

Emprestar livros? Não! Sou ciumento demais. O último que fui forçado a emprestar não fui eu quem autorizou, esse crime lesa patrimônio cultural foi parar na França... E se eu não cobrasse o famigerado sobrinho, teria ficado sem... Salvou-me o Rum Creosotado. Peraí­, esse é outro capí­tulo... E essa é velha, hein? Meu passado depõe. Não, meu livro apareceu! Sabe-se lá como. Aliás nem me interessa! O bom filho à casa retornou. Obrigado cunhada (a responsável pela volta do filho pródigo)!

Há cerca de cinco anos, no meu vasculhar de livros, ainda naquele tempo existiam livrarias que vendiam só livros, pasmem, vi um livro sobre as árvores que ladeiam nossas mal cuidadas ruas de São Paulo. Vi, olhei e gostei. Mas meu orçamento andava meio baleado e eu anotei mentalmente que seria um livro a comprar, brevemente.

Vai daí­ que sumiu o dito livro! Não achei mais, em nenhuma livraria, nesses últimos anos. Toda vez lá chego eu perguntando: -"Moça! Tem um livro que eu vi sobre árvores plantadas na cidade de São Paulo, você tem?"

Nem tem e nem conhece... Eu não desisto, repito, qual um mantra, sempre a mesma pergunta. Já vi olhares piedosos, interrogativos, aflitos, mãos que compulsam catálogos, mentes caridosas que vão às estantes para tentar achar pelo assunto, a maioria esmagadora com um não pronto na lingua...

Agora com o computador então, a resposta vem mais rápida, uma olhadinha e pimba! -"Não!" (Fim de papo)

Não é não! Não há a quem recorrer...

Ontem foi diferente. Sob um sol abrasador, um congestionamento, uma livraria que, intuí­, teria ar condicionado, que eu nunca tivera oportunidade de parar pois sempre estou com pressa de ir a algum lugar...

Resolvi parar o mundo que eu queria descer. Encostei numa vaga, o carro, quem você pensou que fôsse? Entrei na livraria e entoei o meu mantra.

Pois não é que tinha o raio do livro! Aliás dois! Diferentes. O vendedor me explicou que primeiro havia um da mesma autora sobre o mesmo assunto e era um que eu não conhecia, depois é que vinha o tal sobre as árvores de São Paulo!

O, ou os, livros haviam sido reeditados! Não me cabendo em mim e nem acreditando muito, pedi para ver.

Lá estavam! A autora, Jean Irwin Smith, os dois livros, reeditados. O primeiro chama-se Que Árvore é Aquela? O segundo, Árvores Ornamentais na Cidade de São Paulo.

Ao ler a introdução lá está, Jean chegou ao Brasil há mais de 30 anos, queria escrever um livro, aliás ilustradí­ssimo com lindas aquarelas, onde se pudesse conhecer o nome das árvores e algo sobre as mesmas. São Paulo, a cidade e suas ruas sombreadas por árvores, pasmem, foi sua inspiração. São Paulo de todos nós!

E foi escrevendo o primeiro, aquarelando folhas, as flores, olhando as ruas de São Paulo, limitou-se ao que viu perambulando por boa parte da cidade e as que possue em sua casa ou imediações, lá pelas bandas da Chácara Flora onde mantém uma espécie de coleção particular. Depois, não contente com o número de espécies que haviam ficado para trás, completou mais um volume no mesmo estilo do primeiro. Ambos se complementam. Provavelmente não esgotam o assunto, São Paulo é imensa, seu povo e suas árvores, idem!

Seu jardim é ponto de visita obrigatório de grandes apaixonados pela botânica.

E no entanto, a maioria dos espécimes está por aqui mesmo, em nossas ruas, por vezes retorcidas e deformadas pela poda impiedosa que muito mal fazem os que dela deveriam cuidar.

Seu primeiro livro data de mais de 20 anos. O segundo, menos, é o caçula.

Como andamos cegos por nossa cidade! Dois livros inteiros sobre as árvores da nossa amada São Paulo! E basta olhar para os lados! Ao vivo e a cores!

Por favor, não me peçam os livros emprestados. Eu sofreria muito se os emprestasse...

Já, os livros de Jean Irwin Smith, os recomendo por serem únicos.

Jacques

sexta-feira, abril 08, 2005

Turandot - Um final repensado

No artigo abaixo, "De Turandot e Turandot", depois de publicado, não consegui editar, o Blogger está constipado, e incluir o seguinte trecho:

Tanto Alfano (em 1926) quanto Berio (em 2001), utilizaram-se do mesmo texto para encerrar a obra. O libretto em ambos os casos, de autoria de Giuseppe Adami e Renato Simoni, foi rigosamente seguido por ambos.

Normalmente quando se fala de de uma ópera esquece-se de citar os librettistas que respondem pelo texto, uma injustiça.

Aqui no caso, já para dizer que trecho, está sendo usado no sentido figurado, sempre sei como começo, mas deixo os pensamentos criarem asas, transcrevo abaixo o texto:

Os versos, em italiano:

TUTTI
Liù, bontà, Liù, dolcezza,
dormi! Oblia!
Liù Poesia!

(Fim da composição e orquestração de Puccini)

(Começo da orquestração e composição, tanto de Alfano quanto de Berio)

CALAF
Principessa di morte
Principessa di gelo!
Dal tuo tragico cielo
scendi giù sulla terra!
Ah! Solleva quel velo!
Guarda, guarda, crudele,
quel purissimo sangue
che fu sparso per te!

TURANDOT
Che mai osi, straniero!
Cosa umana non sono.
Son la figlia del Cielo
libera e pura.
Tu stringi il mio freddo velo
ma l'anima è lassù!

CALAF
La tua anima è in alto,
ma il tuo corpo è vicino!
Con le mani brucianti
stringerò i lembi d'oro
del tuo manto stellato.
La mia bocca fremente
premerò su di te...

TURANDOT
Non profanarmi!

CALAF
Ah! Sentirti viva!

TURANDOT
Indietro!

CALAF
Sentirti viva!

TURANDOT
Indietro!

CALAF
Sentirti viva!

TURANDOT
Non profanarmi! Non profanarmi!

CALAF
Il gelo tuo è menzogna!

TURANDOT
Indietro!

CALAF
È menzogna!

TURANDOT
No, mai nessun m'avrà!

CALAF
Ti voglio mia!

TURANDOT
Dell'ava lo strazio
non si rinnoverà! Ah, no!

CALAF
Ti voglio mia!

TURANDOT
Non mi toccar,
straniero!
È un sacrilegio!

CALAF
No, il bacio tuo mi dà l'eternità!

TURANDOT
Sacrilegio!
Che è mai di me?
Perduta!

CALAF
Mio fiore!
Oh! Mio fiore mattutino!
Mio fiore, ti respiro!
I seni tuoi di giglio...
... ah! treman sul mio petto!

DONNE
Ah!... Ah!... Ah!...

CALAF
Già ti sento mancare di dolcezza,
tutta bianca nel tuo manto d'argento!

TURANDOT
Come vincesti?

CALAF
Piangi?

TURANDOT
È l'alba! È l'alba!...
È l'alba! Turandot tramonta!

BAMBINI
L'alba! Luce e vita! Tutto è puro!
Tutto è santo!
Che dolcezza nel tuo pianto!

UOMINI
L'alba! Luce e vita! Principessa,
che dolcezza nel tuo pianto!

CALAF
È l'alba! È l'alba!
E amor... e amore
nasce col sole!

TURANDOT
Che nessun mi veda,
la mia gloria è finita!

CALAF
No! Essa incomincia!

TURANDOT
Onta su me!

CALAF
Miracolo! La tua gloria
risplende nell'incanto
del primo bacio, del primo pianto!

TURANDOT
Del primo pianto... Ah...
Del primo pianto!
Sì, straniero, quando sei giunto,
con angoscia ho sentito
il brivido fatale
di questo mal supremo.
Quanti ho visto morire per me!
E li ho spregiati;
ma ho temuto te!
C'era negli occhi tuoi
la luce degli eroi.
C'era negli occhi tuoi
la superba certezza...
E t'ho odiato per quella...
E per quella t'ho amato,
tormentata e divisa
fra due terrori uguali:
vincerti o esser vinta...
E vinta son... Ah! Vinta,
più che dall'alta prova,
da questa febbre che mi vien da te!
CALAF
Sei mia! Mia!

TURANDOT
Questo, questo chiedevi,
Ora lo sai.
Più grande vittoria non voler!
Parti, straniero, col tuo mister!

CALAF
Il mio mistero?
Non ne ho più! Sei mia!
Tu che tremi se ti sfioro!
Tu che sbianchi se ti bacio
puoi perdermi se vuoi!
Il mio nome e la vita
insiem ti dono.
Io son Calaf, figlio di Timur!

TURANDOT
So il tuo nome! So il tuo nome!

CALAF
La mia gloria è il tuo amplesso!

TURANDOT
Odi! Squillan le trombe!

CALAF
La mia vita è il tuo bacio!

TURANDOT
Ecco! È l'ora!
È l'ora della prova!

CALAF
Non la temo!

TURANDOT
Ah! Calaf,
davanti al popolo con me!

CALAF
Hai vinto tu!

Scena Seconda

FOLLA
Diecimila anni
al nostro Imperatore!

TURANDOT
Padre augusto,
conosco il nome dello straniero!
Il suo nome... è Amor!

FOLLA
Amor!
O sole! Vita! Eternità!
Luce del mondo è amore!
Ride e canta nel sole
l'infinita nostra felicità!
Gloria a te! Gloria a te! Gloria!


É curioso notar que, na orquestração de Alfano, a mais antiga e conhecida pela maioria, este opta por terminar a ópera num "crescendo" tão a gosto dos compositores mais modernos. Quando termina a última nota a ovação é espontânea. É o clímax que irrompe da platéia provocado pelas altas notas. As palmas só vão cessar quando todo o elenco todos seus artistas são ovacionados.

Já na orquestração de Berio, o final é mais introspectivo. O final da ópera, longe de ser triunfal, é um anti-cíimax. A música, belíssima, convida a uma introspecção. A letra não foi mudada, a cena foi profundamente repensada, Calaf e Turandot se cumprimentam por sobre o corpo de Liù. O tom mais grave impresso por Berio valoriza a sensação que "não basta vencer por vencer". Eu diria que Turandot reconhece sua vitória por cima de um cadáver que a acompanhará o resto dos seus dias. Calaf também levará todo o peso da morte de Liù, por quem esta se sacrificou.

A ópera termina menos grandiosa mas, certamente mais humana. Ambas são dignas do nosso mais sincero aplauso. E a vitória deve ser repensada. Ela realmente não foi total.

Eu diria que podemos vivenciar essa vitória, tão amarga quanto a Turandot de Berio, nos últimos acontecimentos que estamos convivendo. Não há do que regozijar-se. Não há porque!

Esse, por si só, já é um tema a ser repensado.

Jacques

quinta-feira, abril 07, 2005

A Turandot na Cidade Proibida de Beijing (capa)


A Turandot de Alfano

A Turandot no Festival de Salzburg (capa)


A Turandot de Berio

Reparem na altura de Turandot!

De Turandot e Turandot...

Olá!

Conforme um de meus primeiros artigos por aqui, recebi uma segunda versão em DVD da ópera Turandot, a última opera de Puccini.

As duas diferem num detalhe, o final. Se me repito, desculpem-me os que já leram. Serei breve.

Puccini trabalhou muito na sua última obra, deixou vários estudos mas tinha dúvidas de como finalizar a trama. Deixou-a inconclusa. O trabalho foi entregue a Alfano, que vinha de um sucesso recente, pelas mãos de Arturo Toscannini que era o maestro que regeria a estréia.

Na primeira noite,Toscannini, especula-se, não tendo gostado do fecho encomendado a Alfano, parou a ópera onde Puccini havia escrito sua última nota, a cena onde Liù se sacrifica por seu amo e amado Calaf. Virou-se para a platéia e disse algo como: -"Aqui Puccini parou de escrever sua ópera!".

Ainda no terreno da especulação, Alfano teria aceitado algumas das sugestões de Toscannini e êste, na noite seguinte, regeu até o final que conhecemos.

No entanto, esse final de Alfano, tendo em vista o exíguo tempo que tivera para compor, e ainda à vista dos diversos esboços deixados e não aproveitados, fizeram com que a Editora Ricordi, editora da obra, tenha encomendado a Berio, outro compositor, um segundo final para a obra.

Ao que li, Berio entregou o novo final em 2001. Em 2002 foi levada à cena esta versão modificada de Berio, que aliás é belíssima.

Não querendo adentrar na discussão de qual final é o melhor, qual seria o mais provável, acho que isso é assunto para pessoas com muito mais competência do que a minha, passo a tecer alguns comentários sobre duas montagens de que possuo os DVDs.

A primeira, Puccini - Turandot at the Forbidden City of Beijing / Mehta, Casolla, Larin, Frittoli, Maggio Musicale Fiorentino (1998).

A segunda, Puccini - Turandot / Gergiev, Schnaut, Tear, Vienna State Opera (2002).

A primeira, gravada na Cidade Proibida de Beijing, numa montagem verdadeiramnte cinematográfica, com figurinos tradicionais, toda uma pesquisa histórica, todo um cuidado em apresentar uma Turandot "comme il faut", o que, diga-se de passagem, traz à cena um realismo que emociona.

A segunda, gravada em Salzburg, Austria, com uma visão totalmente diferente. O figurino foi baseado em homens-máquina. O clima a ser passado é o de como, numa nação sem liberdade os homens passam a agir como máquinas, chegando a ter membros mecânicos, próprios para produzir mas não tendo direito de pensar, transformam-se em autômatos, e como tais agem. São apenas peças de uma engrenagem, são apenas objetos descartáveis, intercambiáveis e sem nenhum valor.

Seus governantes em contrapartida são retratados como seres superiores, a ponto da Turandot, em suas cenas iniciais parecer imensa, eu diria com cerca de 9 metros de altura, que é mais ou menos o comprimento de sua ampla saia. De lá ela dita e comanda seus infelizes pretendentes, aos quais, não resolvendo os três enigmas propostos, são encaminhados ao cadafalso e sumariamente decapitados.

O imperador, sentando num trono, sem mover um músculo, governa despoticamente um povo sofrido e mecânicamente obediente. Para não faltar com a grandiosidade da cena, o sacerdote é outro que sem emoção ou movimentos aparentes completa essa ditadura de poder e de atos. Ouso dizer que o cenário e o figurino são extremamente pertinentes ao enrêdo e valorizam sobremaneira a montagem.

Mais não vou falar porque quero entrar numa parte mais humana do que é o gênero ópera. Recomendo ambas as versões, que divergem nos instantes finais mas comungam com o que há de belo na música. Ambos os finais são possíveis, ambos são válidos, o futuro dirá qual o mais palatável.

O que me chamou a atenção, e não foi surpresa, pois já tinha visto essa diferença em outras óperas que assisti, foi a dicotomia entre os personagens e seus cantores.

Enquanto na primeira Turandot os personagens têm o físico compatível com a idade e com os caracteres de seus papéis, na segunda o que se impôs foi apenas a voz, a música, os caracteres e os cenários.

Na segunda, Turandot, jovem e cruel, é interpretada por uma mulher de "meia" idade, Calaf, o galã que vai tentar resolver os ditos três enigmas, é um robusto senhor com mais de cem quilinhos. Seu pai, cego e teoricamente mais velho que o filho, físicamente é o melhor, mas realmente eu gostaria que ele "fôsse" mais velho. Liù, a meu ver, a heroína de Puccini, representa mal, mais parece uma daquelas caricaturas de um filme de Fellini (que exagero, o meu), pobrezinha.

E apesar de tudo isso, musicalmente, cenograficamente a coisa funciona muito bem.

Tudo isso para dizer que na ópera é possível ambientar-se em épocas diferentes das originais, a parte física dos atores deve ser relevada, a capacidade interpretativa deve ser bem medida.

Não é o caso aqui de dizer, musicalmente, qual Turandot, a ópera, é melhor. O que quiz transmitir é que mesmo onde há discrepâncias físicas o resultado final pode ser muito bom. Ainda que hoje os cantores de ópera, em sua grande maioria, sujeitem-se à ditadura da moda atual, são mais esbeltos, suas vozes são mais o produto de muito estudo e longos ensaios, em detrimento de outras teorias que impunham grande "volume" para cantar.

A grande verdade é que a voz humana é o único instrumento musical que usa o próprio corpo para emitir sons. É diferente de um violino, de um piano, de uma clarineta, que são instrumentos "externos". Se um piano, uma trompa ou o instrumento que for, estraga, das duas uma, ou conserta-se ou substitue-se.

Com os cantores, seu único "instrumento" é a voz. E porisso damos tanto valor a esses instrumentos tão perfeitos quanto sensíveis. São anos e anos de estudos e treinos. Teoria, prática, ensaios, aprimoramento da voz, repertório, enfim, um sacerdócio e uma privação diária.

Não é porque o peso dos anos se traduz na balança ou no espelho que devemos descartar esses "canários". Não é praticamente possível atender todos os requisítos do personagem para que este ou aquele cantor cante aquele específico papel. Seria quase que como se escolher fulano para o papel tal nesta ópera. E fim, pois não há dois caracteres ou personagens iguais.

Apenas para concluir, Wagner, em uma de suas óperas escreveu sua descrição para uma personagem, uma senhora de meia idade, com seus 35 anos, pode? Isso hoje é inconcebível... Nessa idade os cantores ainda estão em processo de aprimoramento.

"Tempus fugit!"

Jacques