Carta entre amigos
Que prazer receber sua carta hoje!
Clington, meu mordomo, perdeu-se ao ir até a porta do Castelo e eu quando recebi a sua carta não consegui abrir o envelope, tinha tomados uns whiskys a mais...
Só bem mais tarde é que fui ler. Não posso deixar de responder suas amáveis linhas...
Para facilidade, transcrevo aqui, parte de sua missiva:
"Admiro a cultura alheia com todo o meu ser! como amo a cultura, em todas as suas manifestações! Em você, Ivy, revisito minha visão daquele Lord, de chambre, fumando cachimbo (ok, já sei!!!), ouvindo ópera bem alto no seu castelo, ao entardecer, ao pé da lareira...Ou então caçando raposas...if you know what I mean! Ou, ainda, em Veneza, sentado num café com um livro nas mãos, o olhar distante...talvez admirando o perfil de uma chiezza qualquer...ou, quem sabe aquele schollar, lendo uma pilha de alfarrábios numa língua longínqua e exótica, hindu, aramaico...
A cultura alheia... porque eu me vejo um ser inacabado, ou mal-acabado. Faltou concentração, eu me dispersei no caminho. Sério. Enfim... c´est la vie!"
Bondade sua, minha cara!
Desde que meus antepassados mudaram-se para o Quaff´s Castle muita coisa mudou, cara Skimbleshanks...
Primeiro tive que vender parte de minhas propriedades porque as raposas resolveram se mudar para terras mais calmas.
Por essa ocasião, ainda via por aqui a pequenina Elisabeth que aqui vinha passar parte de suas férias. Depois, pouco a pouco vi minguarem meus recursos e tive que vender outra parte da minha propriedade.
O Quaff´s Castle antes parte de um área totalmente dedicada à caça das raposas viu minguar seus recursos com essa lei passada esses dias no Parlamento proibindo esse esporte realmente nobre. O que os meus pares vão fazer? Com que vão se divertir? Deviam deixar de se preocupar conosco, sabemos muito bem nos cuidar...
Mais, com a venda da maior parte da propriedade, acabaram-se as festas e os amigos foram rareando.
Hoje, com meus recursos em baixa, vi-me obrigado a dispensar todos os empregados do Castelo, restando apenas Clington, o mordomo, e eu.
Ora, Clington sofre com o reumatismo e sua memória. Eu, minhas pernas andam fracas. Já não viajo mais como antigamente. Já não sou mais convidado para aquelas viagens em que a comitiva fazia a diferença. Bons vinhos, boa comida, boas companhias...
A comida por aqui também anda muito fraca, porridge no desjejum, porridge com torta de rim no almoço e torta de pombo com porridge no jantar...
Mas tem o lado bom da história, uma vizinha minha, vem aqui tomar o five o´clock tea de vez em quando. Traz uns docinhos muito gostosos e nesse dia não tem porridge...
Aqui, o Clington e eu, vivemos como gato e rato. Ele esconde a garrafa de whisky e eu acho. Aí eu escondo e ele acha... E assim vamos vivendo...
Acho que o pessoal lá de Buckingham anda meio esquecido de mim. Está certo que o menino Charles deve andar meio miope, aquela Duquesa da Cornualha não é lá essas coisas, mas daí a não me mandarem convite...
Ou vai ver que o Clington confundiu os envelopes, pensou que era a de um Lorde amigo meu (era...) a quem eu devo uma alta soma em libras esterlinas e jogou fora o envelope...
Quanto ao meu robe de seda, acho que já conheceu dias melhores... Temo que vou sobreviver a ele...
Minha biblioteca ainda me consola, tenho muito o que ler, quando não bebo, é verdade...
O clima ainda está frio e há muito que não a calefação não funciona, apenas a lareira e o whisky aquecem os meus ossos.
Pois é, Lady Skimbleshanks, ergo um brinde à sua saúde! O sol já vai se por e a luz já não permite escrever!
Cheers!
Ivy"
Cometo a indiscrição de traduzir a carta de meu amigo Sir Ivy, que já conheceu dias melhores, que é um otimista inveterado e um ótimo copo!
Jacques
:
Dear Ivy,
"All I want is a room somewhere,
far away from the cold night air,
with an enormous chair:
would´t it be loverly?"
Thank you very much indeed for your sweet words. Your style is light as a feather, and you are fit as a feedle!
Yours,
(a reader)
Postar um comentário
<< Home