domingo, abril 10, 2005

De pichação, de cidades e de corpos.

Domingo, dia de descansar, não é?

De andar por perto de nossas casas, de visitar parentes, de carregar baterias para mais uma semana.

Há dias que as coisas não correm exatamente como esperamos. Ao fazer essas atividades que todos gostam, as vêzes somos surpreendidos pelo imponderável.

Estava parado, esperando a abertura de um sinal, quando o carro que vinha atrás de mim simplesmente não freou. Por aqui termino o relato porque amanhã é que vou saber o tamanho do prejuízo.

Quem manda eu estar parado naquela hora, no local certo e no momento errado? Descrever os danos? Não é o caso. Amanhã é que vou começar a me preocupar.

Agora, por falar em danos, volto ao assunto sobre o qual eu queria discorrer.

Não é de hoje que, observador do cotidiano que sou, adoro a cidade que vivo e vejo a destruição gráfica dessa nossa querida cidade. Não sou especialista no assunto, não entendo de "tribos", não entendo de arte no sentido que muitos de nossos concidadãos acham que nossa cidade deve ser brindada.

Para mim, pichação é crime! Que prazer sádico deve existir na mente desses mentecaptos urbanos para emporcalhar nossas cidades com grafismos psicóticos? Que prazer mórbido deve convalidar essa agressão à propriedade alheia? E por alheia entenda-se duplamente, a privada e a comunitária!

Grafismos herméticos, caligrafia tribal, locais vigiados, locais inacessíveis, o perigo, a emoção (que emoção?), tudo é desculpa...

Deve haver alguma explicação para o tamanho do prejuizo. Apenas me escapa qual seja essa necessidade que move hordas de pessoas que destroem a cidade onde vivem, apenas para dar vazão a essa sanha insana.

Não há policia que coiba tamanha chusma de depredadores urbanos. Alguma coisa há de se fazer. Não sei realmente qual é o ponto fraco, onde atingir esse inimigo urbano. Será que ninguém vê? Ou será que ninguém quer ver?

E a meia dúzia que é flagrada enquanto dá vazão a essa destruição da propriedade comum? Será que é punida? Será que a pena redime? Será que não há reincidência?

Gostaria de saber todas essas respostas.

Mas, há ainda, uma outra "mania" atual que muito me preocupa.

A tatuagem. Enquanto existem os que causam danos a suas cidades, existe uma nova mania que grassa em nossa população.

De início, restrita a algumas raras camadas do povo, notadamente marinheiros e populações carcerárias, a moda hoje atinge todos os extratos de nossa população. Não posso considerar isso um fenômeno local pois, há muito, venho notando uma tendência mundial à disseminação dessa "arte" desfigurativa.

Certamente haverá muitos que discordarão dessa minha assertiva.

Estes argumentarão que cada um usa a liberdade individual para fazer o que quizer com o corpo. De certa maneira acho até procedente a livre expressão individual.

Não sendo eu obrigado a fazê-lo, perguntarão alguns, porque deveria eu expressar a minha posição contra as tatuagens?

Acho que, pichar a cidade e tatuar o corpo, são manifestações que visam agredir aqueles que como eu, vêm nesses atos mais semelhanças do que diferenças temporais.

Como judeu que sou, não posso esquecer que a tatuagem, na parte interna do antebraço esquerdo, era como os nossos irmãos (eram judeus, ou ciganos, ou homossexuais entre outras minorias "indesejadas") eram identificados pelos nazistas, quando entravam como prisioneiros em campos de concentração, trabalhos forçados e "pesquisa científica" eram destinos comuns, sofrimento físico e sofrimento mental dia após dia, semana após semana, até a morte que os libertava ao custo da própria vida, se é que aquilo que sobrou aos que sobreviveram possa ser chamada de vida. Seqüelas físicas e mentais, foi o que restou desses farrapos humanos.

Só quem conviveu com esses sobreviventes, quem já conversou com qualquer desses seres humanos, cujo único "pecado" e crime, era o de pertencer a algumas minorias discriminadas, eram submetidos a todo tipo de humilhações e privações, inclusive a de serem marcados como gado. Isso quando não iam direto para câmaras de gases, pelotões de fuzilamento ou exterminados bárbara e sumariamente.

E para dizer pouco, alguns deles sobreviveram à barbárie, a maioria pereceu antes que o suplício mundial se acabasse. Nunca fizeram alarde, nunca se postaram agressivos perante aqueles que os desgraçaram, nunca fizeram apologia do que quer que fosse, queriam apenas viver da melhor maneira possível aquilo que lhes restou após esses inomináveis sofrimentos a que foram submetidos. Eram e são, verdadeiras lições de vida. Sobreviveram ainda que tivessem sofrido na carne os efeitos do que é ser tratado como sub-humano. E no entanto, numa lição de vida, tornaram-se tão fortes que sobreviveram ao suplício inflingido.

A pichação e a tatuagem, a agressão ao bem público e privado, a agressão a sí e a seus semelhantes, tudo isso é profundamente lamentável.

Quanto à pichação, há de se esperar que nossas autoridades encontrem um remédio eficiente para que nossas cidades possam se curar dessa agressão comunitária.

Quanto às tatuagens, rezo para que a moda passe, rezo para que essa deformação visual de corpos não deixe seqüelas nessa jovem população que aprecia hoje essa agressão, que, se não agride aos que a ela recorrem, agride aqueles que tiveram entes queridos, conhecidos ou pessoas que pertencem a seu círculo, aprisionados, mutilados e ainda pior, mortos em nome de uma causa paranóica.

Com que olhos, daqui um tempo razoável, digamos, umas dezenas de anos, essa população olhará para seus braços, suas pernas, e mesmo aqueles que as colocaram em locais onde não vêm, a não ser no espelho, verá essas fúteis manifestações de "moda"?

Que eles nunca tenham em seus pensamentos o peso de uma geração que passou por uma agressão inominável, que eles nunca se arrependam da agressão a que se auto impuseram.

E que a moda da pichação se esvaia e que nossas cidades curem-se dessas mutilações auto infligidas. Sem mais recaídas...

Jacques

:

Blogger Unknown said.

hahhahahaha

quanta ignorancia!

10 junho, 2008 03:08  

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