quarta-feira, março 23, 2005

A respeito da Ética

Continuando o raciocínio do meu artigo anterior, tenho a impressão que a maioria de nossos políticos tem uma visão muito pessoal a respeito de suas funções.

Desde menino, quando escuto a Protofonia d'O Guarani, por achar a Hora do Brasil uma bobagem que herdamos da época do Estado Novo o meu reflexo é um só, ou desligo o rádio ou mudo de estação para aquelas que conseguiram de algum modo de livrar desse entulho getulista ou ainda passo para um CD. Trata-se de politicagem barata, verdadeira tribuna dos incompetentes, que aliás vetaram a própria extinção do programa.

No entanto sempre tenho a curiosidade de saber como funciona e o que está se passando no interior de nossas Casas Legislativas. Como complemento, também gosto de saber o que se passa nos Tribunais de nossa nação. Sobre estes falarei em outra ocasião.

Assim é que de tempos em tempos dou uma parada nas transmissões e retransmissões das emissoras de TV e fico escutando. Com o passar dos anos, a impetuosidade da juventude deu lugar a uma maturidade que me trouxe a paciência e o dom de tentar entender o que os outros pensam. E meu raciocínio e a capacidade de concentração também melhoraram.

Não há de se negar, no caso de nossos nobres causídicos, que a maior parte do que escuto é destinada ao "grande arquivo redondo", repositório final da soma de nulidades que é a fauna presente no dia a dia das causas diminutas a que estamos condenados a escutar. O cultivo de vaidades, o panegírico das picuínhas e por aí vai. Não adianta, dia vai, dia vem e o discurso vazio prospera como erva daninha num pasto mal cuidado.

Até aí, nada de mais. Apesar de serem os representantes de um povo, são oriundos desse mesmo povo e portanto têm representatividade.

Quando ontem disse que democracia pressupõe que "não é o regime onde todos fazem o que querem, a democracia é um regime onde todos pensam e têm convicções próprias mas todos olham para o mesmo objetivo", acho que é aí começa emergir o cerne do problema.

Não sou só eu que vejo a dança de cadeiras que, ao sabor de interêsses inconfessáveis ou tão secretos que fogem ao cidadão comum, faz com que o nosso representante esteja hoje a serviço de um partido e amanhã quem sabe onde estará.

Repisar o óbvio é inútil. Quantas vêzes, antes mesmo de assumir um mandato, o seu, o meu, o nosso representante já trocou de partido? Já votei em candidatos que mudaram de lado com a mesma displicência que trocam de camisa. E me arrependi muitas vêzes de ter dado o meu voto para êste ou aquêle candidato. E é lógico que não sou o único.

Quantas vêzes mudam seu voto, da água para o vinho, ao sabor dos conchavos e das oportunidades que se sucedem em rítmo alucinante? Quantas vêzes obstruem votações importantíssimas por não serem de seus inconfessáveis interesses? Quantas vêzes menosprezam assuntos importantes em nome de querelas intestinas? Quantas vezes mudam seus votos sem se preocuparem com os aspectos mais importantes e detendo-se em minúcias e questiúnculas absolutamente inoportunas? Quantos honram seus mandatos com dignidade? Quantos respeitam as diferenças alheias e fazem o que é bom para a nação, independente de um "ego" inchado por vaidades sobrepondo o que é importante do que é fútil? Garanto que nunca mudaram de time de futebol, afinal futebol é assunto sério...

Não sou um entendido em política, também não entendo muito de filosofia. Aliás, existem muito mais coisas que não entendo do que aquelas que sei pouco. Portanto, às vêzes, posso misturar conceitos ou mal precisar determinadas definições.

Mas tenho que assumir minhas limitações e partir para definir ou entender, ainda que parcialmente, determinados conceitos. Portanto se a sua definição de Ética divergir um pouco da minha, dê o devido desconto e tente entender o sentido do que pretendo dizer.

A meu ver, o que falta aos nossos representantes, eleitos por nós e pagos por todos nós é Ética.

Ética para tomar decisões adequadas, ética para se comportar como representantes que são de um povo sofrido e pobre, ética para saber o rígido limite que há entre o que é certo e o que é errado, ética para saber até onde vão convicções pessoais, até onde é filosofia do partido, até onde é lícito avançar sem que a lei e a dignidade de seus atos prejudiquem a nação.

Eu entendo que um ou outro parlamentar possa entrar em conflito pessoal com partidos, com idéias, com pessoas, enfim, faz parte da dialética do cargo, o que eu não entendo é porque o que é exceção passa a ter o valor de regra. Nesse grande painel de opiniões estão lado a lado os competentes e os incompetentes, os que estudaram e os que mesmo não tendo estudado tiveram um aprendizado não ortodoxo e são autodidatas, estes e aqueles, capazes e incapazes. Será que no recesso de seus gabinetes esses cidadãos não refletem um pouquinho que seja a respeito das conseqüencias de seus atos? Será que não são brasileiros?

Será que pelo fato de se vestirem de deputados e senadores a Ética muda?

Ontem quando disse que o tempo não volta essa foi a questão que coloquei. Individualmente até acredito nas boas intenções da maioria desses cidadãos. O que me assusta é quando se reunem em bandos. O que será que acontece quando esses luminares que nos representam se reunem no plenário para legislar? E o que se passa naqueles corredores?

Ou o sistema está todo errado ou a Ética é um artigo em falta. Eu opto pelo segundo argumento.

Jacques

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