Cavalleria Rusticana e Pagliacci - Mascagni e Leoncavallo
No próximo domingo, às 15 horas ouviremos não uma, duas óperas. É interessante notar que, embora escritas por autores diferentes, em datas diferentes, essas duas óperas são tradicionalmente levadas em conjunto, por uma dessas tradições que começaram por acidente e que se perpetuaram ao longo do tempo.
A verdade é que ambas são complementares e formam uma bela combinação. Mais sobre esse intrigante duo será abordado logo abaixo.
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MASCAGNI - Cavalleria Rusticana. Solistas: Maria Callas, Giuseppe di Stefano, Rolando Panerai, Anna Maria Canli, Ebe Ticozzi. LEONCAVALLO. Pagliacci. Solistas: Maria Callas, Giuseppe di Stefano, Tito Gobbi, Nicola Monti, Rolando Panerai. Coro e Orquestra do Teatro alla Scala de Milão. Reg.: Tullio Serafin.
Apresentação: maestro Walter Lourenção.
Cavalleria Rusticana e Pagliacci: gêmeos siameses da Ópera
Pietro Mascagni e Ruggero Leoncavallo têm algumas coisas em comum: eles escreveram sucessos líricos instantâneos, através dos quais seus nomes entraram na história musical. Pode também ser dito que somente através dessas únicas obras seus nomes
serão relembrados. Ambos foram produtos de famílias não musicais e suas ambições líricas foram o princípio de muito trabalho duro durante muitos anos.
Cavalleria Rusticana foi originalmente uma peça que Mascagni assistiu como estudante em Milão. Imediatamente reconhecendo seu potencial musical, Mascagni recebeu a permissão do autor dramático, Giovanni Verga, para adaptar a peça para o teatro lírico. Giovanni Targioni-Tozzetti, um antigo colega de escola de Mascagni, escreveu o libreto da ópera.
Embora Mascagni tenha escrito outras treze óperas, somente algumas foram executadas, e não são tão populares como Cavalleria.
Leoncavallo escreveu seu próprio libreto para Pagliacci, e uma vez que ele ajustou-o à música, ela ganhou o mesmo prêmio que Mascagni havia ganho dois anos antes com Cavalleria. Embora o sucesso de Pagliacci tenha tornado Leoncavallo uma estrela instantânea, e outros de seus trabalhos tenham sido executados, somente poucas óperas posteriores obtiveram algum sucesso.
As semelhanças entre as circunstâncias da composição e dos compositores dessas óperas são importantes para a sua relação única, mas as próprias obras carregam ambas semelhanças musicais e dramáticas.
Ambas as óperas são tragédias violentas envolvendo infidelidade conjugal, ambas fazem uso semelhante de cenários rústicos italianos, e ambas apresentam, de forma destacada, um coro de camponeses.
Também existem semelhanças na estrutura dessas óperas. O prelúdio de Cavalleria é a Siciliana de Turiddu, enquanto que Pagliacci é aberta pelo Prólogo. Embora as duas aberturas sejam apresentadas de forma muito diferente -Turiddu canta nos bastidores, enquanto Tonio se dirige diretamente ao público- ambos explicam os eventos que se seguem, de forma bastante literária.
Ritual - a celebração da massa em Cavalleria e as ações "programadas" da peça de Pagliacci -torna-se um catalisador da ação em ambas as óperas. A excomunhão de Santuzza da Igreja Católica e o desespero de sua existência solitária é enfatizada pela celebração da Páscoa por toda cidade, e leva-a a revelar a verdade a Alfio. A infidelidade de Nedda é literalmente ressaltada pelo seu papel na peça, e seu decreto enfurece Canio e leva à sua morte. Os dois protagonistas são moldados pelo meio ambiente, e em um certo sentido são vítimas do hábito ritual e artístico.
Cavalleria Rusticana estreou em 17 de maio de 1890 em Roma, no Teatro Constanzi e foi apresentada pela primeira vez no Metropolitan Opera em 30 de dezembro de 1890. Pagliacci, apresentada pela primeira vez em Milão, no Teatro al Verme em 21 de maio de 1892, teve a sua primeira execução no Metropolitan Opera em 11 de dezembro de 1892. Antes de se tornarem companheiros inseparáveis, ambos os trabalhos fizeram suas estréias no Met dividindo as noites com Orfeo e Euridice de Gluck.
Cavalleria Rusticana
Compositor: Pietro Mascagni
Texto do libreto em italiano: Giocanni Targioni-Tozzetti e Guido Menasci, baseado em um conto de Giovanni Verga
Première Mundial: Roma, Teatro Costanzi, 17 de maio de 1890
Pagliacci
Prólogo em dois atos
Compositor: Ruggero Leoncavallo
Texto do compositor
Première Mundial: Milão, Teatro dal Verme, 21 de maio de 1892
Cavalleria Rusticana
Turiddu -- (tenor) um jovem, ex-oficial do exército, que é especialmente instável com as mulheres. Anteriormente apaixonado por Lola, ele corteja Santuzza. Ele volta para Lola, embora ela esteja casada, e Santuzza esteja grávida.
Santuzza -- (soprano) uma mulher apaixonada por Turiddu, de quem engravida. Por causa disso ela é excomungada pela Igreja e é afastada.
Alfio -- (barítono) o carroceiro da cidade e marido de Lola. Apesar de ser ciumento por natureza, ele confia na fidelidade de sua esposa.
Mama Lucia -- (contralto) mãe de Turiddu, ela administra uma pequena hospedaria.
Lola -- (meio-soprano) a namoradora esposa de Alfio, por quem Turiddu está apaixonado.
Pagliacci
Canio -- (tenor) o irritadiço líder de meia idade dos atores. Na peça da trupe ele faz o papel de Pagliaccio, o palhaço e marido traído.
Nedda -- (soprano) a jovem esposa de Canio, que representa a esposa de Pagliaccio na peça da trupe. Ela cresceu cansada de Canio e sua vida de viagens constantes. Ela se apaixonou por Silvio, um jovem da aldeia.
Tonio -- (barítono) um amargo e irritado corcunda que é atormentado por sua paixão por Nedda. Ele representa o personagem de Taddeo, um criado na peça da trupe.
Beppe -- (tenor) um ator que representa o papel romântico do amante de Columbina, Arlecchino, na peça.
Silvio -- (barítono) um aldeão e amante de Nedda.
Sinopses:
Cavalleria Rusticana:
É manhã de Páscoa em uma pequena aldeia da Sicília.
Atrás dos bastidores, Turiddu canta serenatas para Lola, a namoradora esposa de Alfio. Santuzza, que está apaixonada por Turiddu e grávida dele, é ouvida questionando Mama Lucia sobre o local onde se encontra Turiddu. Mama Lucia conta-lhe que ele havia ido para Francofonte, uma cidade próxima, para comprar vinho. Santuzza insiste que ele tinha estado na cidade durante a noite. Mama Lucia fica muito surpresa mas recusa se envolver na briga de Santuzza com seu filho. Mama Lucia tenta segurá-la dentro de casa, longe dos barulhentos vizinhos, mas Santuzza diz que ela está sendo excomungada pela Igreja como resultado de seu caso com Turiddu e está sendo banida.
Antes que ela possa explicar que está grávida, Alfio chega querendo comprar vinho. Mama Lucia conta-lhe que Turiddu saiu da cidade para buscar um suprimento adicional para as celebrações do dia. Ele não consegue entender isso, já que ele havia visto Turiddu próximo de sua casa naquela madrugada. Sabendo que Turiddu agora está cortejando Lola, Santuzza faz sinal para Mama Lucia não dizer mais nada.
Alfio parte para se aprontar para a igreja e os aldeões da vila se reúnem na praça. Eles cantam um hino e entram na igreja.
Santuzza relembra Lucia que Turiddu era apaixonado por Lola antes de se juntar ao exército. Ele voltou para casa para encontrá-la casada com Alfio, e imediatamente fez amizade com Santuzza e seduziu-a. Desde então, ele reiniciou seu caso com Lola. Mama Lucia reza para a Virgem Maria ajudar Santuzza, então vai para a igreja, justamente quando Turiddu entra.
Santuzza enfrenta-o conhecendo suas ações verdadeiras, e ele a desaprova por estar lhe espionando. Ela o acusa de amar Lola, e ele a ofende por seu ciúme.
Lola, uma namoradora natural, passeia e vagamente imagina se Alfio já foi para missa. Santuzza e Lola se enfrentam e Lola entra na igreja.
Turiddu vai segui-la, mas Santuzza para-o e ele, muito irritado, atira-a no chão e entra na igreja. Ela o amaldiçoa com as palavras "uma má Páscoa para você!" e jura vingança.
Alfio entra e Santuzza conta-lhe de forma vingativa sobre o caso amoroso entre Turiddu e Lola. Alfio, promete vingança a si mesmo, e Santuzza imediatamente se arrepende de ter lhe contado: ela somente tinha precipitado a inevitável perda de Turiddu. Ela segue Alfio para fora da praça da cidade.
O palco está deserto. A multidão novamente, os aldeões se espalham pela praça e se dirigem para a taberna de Mama Lucia, a convite de Turiddu. No máximo da alegria, Alfio aparece e, recusando a oferta de uma bebida de Turiddu, responde que o licor poderia se tornar um veneno em seu peito.
Pressentindo que uma disputa está para se iniciar, os habitantes da vila se retiram, levando Lola consigo. Os dois sicilianos percebem que a questão só pode ser resolvida de uma maneira. Turiddu desafia Alfio para um duelo ao dar a mordida ritual na orelha direita de Alfio. Alfio promete esperar por Turiddu atrás do pomar.
Sozinho com sua mãe, Turiddu deseja-lhe uma carinhosa despedida e lhe implora para cuidar de Santuzza, no caso dele não retornar. Mama Lucia fica desconcertada com suas palavras. Ele coloca a culpa de seu humor no vinho, e conta-lhe que ele está indo andar para tranqüilizar-se, dá-lhe um beijo apressado e parte correndo.
Santuzza entra e as duas mulheres se abraçam. Escuta-se o murmúrio de vozes de homens à distância e em seguida um grito agudo: Turiddu tinha sido assassinado!
Pagliacci
Cenário: Uma praça de uma vila próxima à
Calábria, província do extremo sul da Itália.
A época é o final da década de 1860
Toda a ação da ópera acontece entre 3 horas da tarde e meia noite de 15 de agosto, a Festa da Assunção da Virgem. Como parte da celebração, uma trupe provincial de atores ambulantes veio para a cidade para representar. Eles já tinham vindo aqui antes e os aldeões os conhecem.
Prólogo: Durante o Prelúdio, Tonio dá um passo adiante e se apresenta como "O Prólogo". Na tradição da arte da comédia, o Prólogo diz para o público não se preocupar se houver uma tragédia no palco, porque, apesar de tudo, é somente uma peça e não a vida real. Tonio, entretanto, nos traz uma mensagem muito diferente:
Senhoras e senhores! Na peça que estão prestes a assistir, o autor quer capturar as velhas tradições e mostrá-las novamente. Mas ele não pretende contar-lhes o que estão sempre acostumados a dizer. Não! Este autor que mostrar-lhes um verdadeiro pedaço de vida. A verdade foi sua inspiração. Verão o amor como o povo real ama. Verão os trágicos resultados do ódio e espasmos da dor real. Escutarão gritos de raiva real e risos cínicos.
Assim, não devem pensar em nosso pobres truques teatrais. Devem pensar em nossas almas, pois somos pessoas de carne e osso -e neste mundo solitário respiramos o mesmo ar que vocês.
Ato I: Os aldeões correm para a praça para receber os atores. Eles estão especialmente felizes em ver seu velho amigo Pagliaccio (Canio), o engraçado palhaço que sempre os faz rir quando anda com dificuldade ao redor do palco. Canio anuncia uma apresentação para as onze horas daquela noite, e promete-lhes sua comédia favorita. "Vocês verão como Pagliaccio comete tolices e se vinga," ele diz, "bem como o medo e o tremor de Tonio quando o enredo se complica."
Tonio tenta ajudar Nedda a descer de sua carruagem, mas Canio empurra-o violentamente. A multidão ri enquanto Tonio jura que ele se vingará desse insulto. Alguns dos homens da aldeia convidam os atores para a taberna local para uma bebida. Canio e Beppe aceitam, mas Tonio recusa. Um dos aldeões provoca Canio, dizendo que Tonio somente quer ficar para trás para
namorar com Nedda. Canio não está se divertindo:
O que acontece em cima do palco e o que acontece na vida real são duas coisas diferentes. No palco, se o velho Pagliaccio encontra sua esposa com outro homem, ele censura-os e até mesmo apanha para o aplauso da multidão. Mas se na vida real Nedda o traísse, o final da história não seria feliz!
Quando os sinos da igreja tocam para as preces do entardecer, Canio, Beppe e os aldeões se dirigem para a taberna. "... sua vingança," ele diz, "bem como o medo e o tremor de Tonio quando o enredo se complica."
Nedda, deixada sozinha, admite que ela está assustada com seu marido; ela sente que ele pode perceber sua inquietação. Ela deseja uma vida diferente e, olhando para cima, para o céu onde os pássaros levantam vôo, ela canta para si mesma sobre a liberdade e alegria deles.
Tonio interrompe-a com uma apaixonada declaração de amor, implorando-lhe para não levar em conta seu corpo deformado. "Eu te amo!" ele diz, "você é meu único desejo e estou determinado a tê-la!" Ela zomba dele e ele tenta forçá-la a beijá-lo. Ela agarra um chicote e bate, atingindo-o no rosto. Ele recua e jura vingar-se.
Um momento mais tarde Silvio aparece, assegurando a Nedda que Canio está na taberna e eles estão a salvo. Ele lhe suplica para abandonar sua vida infeliz e ir embora com ele nessa mesma noite. Ela está incerta, mas diz que o ama. Tonio tinha voltado silenciosamente, e ouvindo os dois amantes por acaso, corre para contar a Canio.
Assim que Nedda e Silvio concordam em fugir juntos à meia-noite, Tonio e Canio retornam. Silvio escapa e Canio segue em perseguição. Enquanto Canio procura o amante de Nedda na escuridão, Nedda, com um tom sarcástico, congratula Tonio por revelar e segredo dela. Canio retorna, sem fôlego e num ataque de ciúmes, ele diz a Nedda que irá cortar sua garganta, mas que primeiro quer saber o nome do amante dela. "Ameaças não me assustam", diz ela. "Eu não revelarei nunca o nome dele!" Canio se joga sobre ela com a faca em punho. Beppe chega em tempo para segurá-lo. Tonio puxa Canio para longe, prometendo que o amante de Nedda irá retornar. Beppe pede a todos para que se vistam. É chegada a hora do espetáculo.
Canio está confuso e exausto:
Representar?! Enquanto eu estou tão delirante que não sei o que estou fazendo (Ele se olha no espelho de sua penteadeira.) Você pensa que é um homem? Você não é nada além de um palhaço!
Coloca sua fantasia e maquia seu rosto. O povo paga para rir, assim se Arlecchino rouba sua Columbina, só risos, palhaço -e todo mundo aplaudirá. Transforme a sua agonia e sofrimento em piadas, transforme as suas lágrimas e mágoas em um rosto engraçado! Ria, palhaço, de seu amor arruinado! Ria da dor que está envenenando seu coração!
Ele entra no teatro chorando, enquanto a cortina desce lentamente.
Ato II: Tonio entra com seu grande tambor enquanto as pessoas chegam para a peça. Quando Tonio convida para o início do show, os aldeões disputam seus assentos. Silvio entra silenciosamente e Nedda avisa-o para ser cuidadoso. O show começa.
Columbina, representada por Nedda, está sentada à mesa. Ela conta ao público que seu marido, Pagliaccio (Canio), está fora. Enquanto ela espera que a galinha assada seja servida para o jantar, faz sinal para seu amante, Arlecchino (Beppe), entrar. Em seguida, seu criado, Taddeo (Tonio), declara seu amor. Ela o menospreza e pede seu jantar. Quando Arlecchino entra para cortejar Columbina, Taddeo inesperadamente abençoa o casal. Quando os amantes preparam-se para jantar, Pagliaccio volta para casa. Arlecchino escapa pela janela, enquanto Columbina lhe diz "até a noite", as mesmas palavras que Nedda havia dito a Silvio mais cedo ao anoitecer. Canio está tremendo com essa situação paralela; tentando falar através do personagem, ele acusa Columbina de estar sendo infiel.
Enquanto o confronto da "peça" entre Pagliaccio e Columbina continua, Canio começa a sair de seu papel e passa para a vida real. Tonio, nos bastidores, empurra Canio para a beira, com comentários sarcásticos. Canio pede para saber o nome do amante de Nedda. Quando ele responde em sua personagem de Columbina, ele grita, "Não! Eu não sou um palhaço! Eu sou o louco que a encontrou morrendo de fome nas ruas e deu-lhe meu nome e meu amor!"
O público fica um pouco confuso, mas cativado pela intensidade da representação grita "Bravo!" Eles não têm idéia que o que está acontecendo no palco agora é perigosamente real. Somente Silvio, no público, está preocupado. Mas Nedda recusa-se decididamente a revelar o nome de seu amante, apesar do interrogatório histérico de Canio. Subitamente Canio puxa uma faca para fora e corre atrás de Neda, que tenta correr para a multidão. Ele a agarra e a apunhala. Ela chama pela ajuda de Silvio. Silvio, correndo em sua defesa, também é apunhalado. Enquanto a multidão recua horrorizada, o enlouquecido e exausto Canio fala "A comédia acabou!"
Jacques
:
Interessante!! Duas tragédias pelo preço de uma... Pensando sobre a imigração italiana no século XIX, principalmente da pobre região sul da Itália para a cidade de New York, é de se entender que os sucessos operísticos italianos chegassem quase que simultaneamente nos palcos americanos. É o transporte da alma latina, da vendetta, de todos aqueles personagens tipicamente italianos, "moldados pelo meio", como você disse. A seguir virão Caruso, Rodolfo Valentino... viva a arte! viva a Itália!
Ah: e viva a Callas!
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