domingo, maio 22, 2005

Anne Gastinel e Frank Shipway obtém crítica mais do que positiva

Lendo o Caderno 2 d'O Estado de São Paulo deparei-me com a crítica que transcrevo abaixo sobre o concerto que presenciei na última quinta-feira e que fiz menção no artigo de ontem.
"Sábado, 21 de Maio de 2005

Shipway obtém da Osesp o melhor da expressão poética
Orquestra mostrou, na quinta,espetáculo equilibrado e grandioso

Nas mãos do regente convidado, o britânico Frank Shipway, a Osesp tocou, na quinta-feira, com desenvoltura e prazer em explorar as possibilidades tímbricas de uma orquestra com ótimos solistas. Shipway tem uma qualidade apreciável: sabe deixar flutuar os andamentos, o que confere flexibilidade à música e um modo espontâneo de se articular. Isso ficou claro desde a maneira como ele moldou a introdução do allegro, no Concerto em Si Menor Op. 40, de Dvorak, ponto culminante da literatura para violoncelo e orquestra.

O som abaritonado, cheio, nítido, que Anne Gastinel extrai de seu Testore, de 1690, foi o ideal para realçar os freqüentes diálogos do solista com os instrumentos da orquestra - traço em que há a influência de Tchaikovsky na forma de escrever para os sopros. Gastinel e seus companheiros da Osesp alcançaram níveis muito altos de expressão poética no adágio ma non tropo, inspirado ao compositor pela doença e morte de sua cunhada querida, Josefina Kounicová. Às cantilenas do violoncelo, de transfigurada serenidade, responderam os desenhos da flauta, das madeiras, da trompa, com equilíbrio que pôs em evidência as texturas camerísticas dessa peça magnífica.

E a energia rítmica, de raiz folclórica, do allegro moderato final, resultou num movimento cujas flutuações emocionais o regente construiu com grande senso de proporção, conduzindo-o a uma coda emocionante na qual o violoncelo de Gastinel contou com o apoio seguro das trompas, das clarinetas. À dramaticidade da peça de Dvorak, Anne Gastinel somou, no extra - a Sarabanda de uma das suítes de Bach - um instante de introspecção.

O concerto que se iniciara com uma execução efusiva, extrovertida, da abertura dos Mestres Cantores de Nuremberg, encerrou-se com as Variações Enigma Op. 36, repertório que deixa Shipway em casa. Ninguém melhor que Elgar soube traduzir sonoramente o mundo em que viveu: a nobreza, a altiva idéia de si mesma que tinha a Inglaterra na era vitoriana. Isso transparece nas 14 variações dessa peça, cuja riqueza de efeitos instrumentais ofereceu à orquestra oportunidades preciosas.

No centro de peça, como uma jóia preciosa encastoada numa tiara, destaca-se a Variação n.º 9 (Nimrod) em Mi Bemol Maior, cuja lírica melodia Shipway construiu com um crescendo bem dosado, de belíssimo resultado. Em torno dela, à veemência de tocata da n.º 3 ou a energia da nervosa n.º 4 , responderam a sutil poesia da n.º 6 ou a elegância de romança da n.º 13, num verdadeiro catálogo de todas as cartas que Elgar tinha na manga.

E essa composição brilhante, na qual o músico homenageia seus amigos, convergiu para a execução grandiosa da variação final, em que Elgar faz seu auto-retrato. Nessa segunda parte, ainda mais do que no concerto de Dvorak, Shipway demonstrou a capacidade de obter da orquestra a expressão natural de seus recursos, de um modo que nos transmitiu mais a sensação de se estar fazendo música, do que a estarmos assistindo a um laborioso exercício de perfeição técnica.

Crítica

LAURO MACHADO COELHO

Especial para o Estado Osesp e Frank Shipway e Anne Gastinel. Sala São Paulo (1.501 lug.). Praça Júlio Prestes, s/n.º, Centro, 3337-5414, metrô Luz. Hoje, 16h30. De R$ 25 a R$ 79"

Nada mais merecido!


Jacques

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