Um pouco sobre música ao vivo
Hoje, eu gostaria de discorrer um pouco mais sobre um assunto correlato. Qual o sentido em ir pessoalmente a uma sala de concerto ou um teatro?
Confesso que não é de hoje que tenho opinião formada sobre o assunto, aliás, acabei de comentar sobre isso com uma amiga e daí, veio a idéia de colocar, por escrito, essas minhas observações.
Por mais que os equipamentos tenham se sofisticado nos últimos anos, uma audição ao vivo é uma experiência insubstituível.
Não quero entrar no mérito dos "shows" e dos "mega-shows" que vimos acompanhando nesses últimos anos, onde as toneladas de equipamento sonoro, pirotecnias da tecnologia (competência dos já mencionados engenheiros de som) e multidões apaixonadas que se espremem num gramado formando uma combinação tão previsível quanto impessoal. Tão impessoal que grande parte dos detalhes do shows é transmitida por telões, pois o palco (imenso) fica tão longe do espectador, que seria uma frustração se apertar tanto para ver pequenos vultos onde não se consegue distinguir pouco mais do que o colorido das luzes e vultos se movimentando no palco. E sem amplificar o som nada se ouviria...
Aqui realmente faz diferença quando falamos em espetáculo de música clássica, vocal (ópera inclusive) e instrumental.
Primeiro, os teatros são concebidos de maneira tal que um solista, vocal ou instrumental, seja ouvido perfeitamente sem alto falantes, portanto escuta-se perfeitamente desde o som do solista até uma orquestra inteira ao natural, sem que seja necessário amplificar absolutamente nada.
Há salas, menores, para música de câmara, onde é possível escutar até a respiração dos músicos...
Em salas de maior tamanho isso já não acontece. Há refletores de som, há abafadores, as cortinas, enfim tudo é cuidado para a audição perfeita.
Com todo esse investimento não há como não escolher a audição ao vivo como "a" opção.
A verdade é que continua a haver uma diferença entre o som gravado e o som ao vivo. Nossos ouvidos são mais perfeitos do que o melhor equipamento que grava e que reproduz uma audição.
Não é escôpo aqui entrar no detalhe de como o som é digitalizado e de como é decodificado em nossos reprodutores de CDs e DVDs. Mas, quem já teve o prazer de ouvir um concerto ao vivo, há de concordar que o som ao vivo de um violino, por exemplo, é bastante diferente do mesmo som gravado e reproduzido com os mais caros equipamentos que estão aí à nossa disposição.
Essa semana tive a grata surpresa de ouvir uma jovem violoncelista, Anne Gastinel, regida pelo maestro Frank Shipway e a Orquestra Sinfônica do Estado de Sâo Paulo, conhecida pela sigla OSESP, na Sala São Paulo. O programa, belíssimo por sinal:
Frank Shipway - Regente
Anne Gastinel - Violoncelo
RICHARD WAGNER
Abertura Os Mestres Cantores
ANTONÍN DVORÁK
Concerto em si menor, Op.104
Variações Enigma, Op.36
Pois bem, tenho duas gravações do Concerto em si menor de Dvorák, e sou testemunha, Anne Gastinel, de longe, é a melhor intérprete que ouvi.
A par de tudo que já falei a respeito do som ao vivo, de outro, realmente, Gastinel é um nome a ser observado como uma das melhores violoncelistas da atualidade.
Os cuidados que cercam um concerto desse porte, chegam a pontos que são primorosos, o programa assim fala do violoncelo que Gardinel tocou:
" Em 1997, Anne Gastinel foi designada embaixadora do violoncelo francês e foi escolhida por Marta Casals-Istomin em Nova York para receber o violencelo mítico Matto Gofriller que pertenceu a Pablo Casals.Não dá para descrever o som que escutei nesse concerto...
Atualmente, Gastinnel toca num Testore feito em 1690 (patrocínio da Associação Fundo Instrumental Francês)."
Apenas fiquemos com uma pequena noção do porque da diferença entre o som ao vivo e o gravado. O ouvido humano é o receptor de som mais perfeito que podemos conceber. Não há tecnologia que substitua esse sentido. Muito pode-se falar de avanços tecnológicos, muito se tem feito nos laboratórios das industrias, mas não há nada que substitua o som emitido diretamente por uma voz ou por um instrumento musical...
Enquanto o tempo corre a nosso favor, na tecnologia que avança, uma jovem mulher de 44 anos, tocando num instrumento do final do século XVII, este sim insubstituível, nos dá uma lição de violoncelo, aliás, justiça seja feita, inclua-se a orquestra nessa magnifica audição, de como é gratificante escutar um concerto ao vivo.
Brava! Bravi!
Jacques
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