quarta-feira, maio 18, 2005

CDs ou DVDs?

Olá!

Já houve época que essa dúvida não se colocava. A verdade é que, nos últimos tempos vivemos uma tal evolução tecnológica que hoje a equação está pendendo para o lado mais improvável.

De um lado, se o CD foi uma revolução no que tange ao registro sonoro, forçando que todo um arquivo de dezenas de anos tivesse de ser digitalizado e remasterizado, o DVD, forçou os produtores de discos, vamos chamá-los assim na intimidade deste artigo, a reformular uma receita que vinha sendo seguida há anos.

Nunca é demais repisar que estamos falando de música clássica e em particular das óperas.

Como se fazia uma gravação, até alguns anos atrás?

Reunia-se o elenco da ópera, os solistas e o coro de um determinado teatro, acrescia-se uma orquestra, normalmente do mesmo teatro, mais maestros e diretores de coro, se colocava todo esse povo num estúdio e gravava-se a ópera.

Pode parecer fácil, mas a qualidade da gravação tinha que ser perfeita, o que fazia com que toda essa troupe tivesse que repetir "ad-nauseam" cada passagem da partitura até que tudo tivesse perfeito. Isso levava dias e dias, um trechinho de cada vez...

Tanto havia os cantores que amavam as gravações de estúdio quanto havia os que odiavam o ritual.

Com recursos de tecnologia, gravação em multi canal e outras facilidades, isso até que se atenuou, um cantor, ou um instrumento que desafinasse ou que saísse do determinado pelo maestro, teria um trecho de uma trilha refeito e nós, mortais, jamais ficamos sabendo dessas mágicas. Corta daqui, emenda dalí e a obra ainda saía com a assinatura do engenheiro de som, que era e é um profissional muito importante na produção final da obra.

Só para dar uma idéia do que faz esse engenheiro, cada sala de espetáculo tem níveis de reverberação que são individuais, a mesma ópera, mesmo elenco, no Metropolitan de New York tem um som diferente do Opéra de Paris, por exemplo. O mesmo teatro, cheio, soa de um jeito, vazio, soa diferente. Existem padrões aceitos mundialmente que atenuam essas diferenças mas, cada projeto, leva em conta os seus parâmetros. Cabe a esse engenheiro recriar todo esse "eco" que vai se incorporar ao som de estúdio. Verdade seja dita, quanto menos interferência houver na gravação original, melhor será a nossa audição.

Só para falar sobre o "nada" que faz esse profissional daria para encher um livro... Verdade é que ele interfere o menos possível na equalização do som, o que garante um efeito "parecido" com o de uma audição ao vivo. Ele recria o som natural do teatro e daí advém a altíssima qualidade das gravações de óperas que povoam as nossas estantes.

Gravações dos últimos 30 anos têm uma clara conotação de perfeição, o tempo já não torna essas gravações obsoletas, aliás, muitos cantores que já nos deixaram ou que já se aposentaram, deixaram registros "definitivos"de sua interpretação. Tenho alguns livros que indicam várias interpretações como "definitivas". Podemos ouvir nossos ídolos no apogeu de suas vozes. É o mäximo!

Um mini parágrafo para a música popular, sem esse profissional, o engenheiro de som e sem sua equipe, haveria bem poucos "cantores"... Tudo o que na música clássica se mexe com muito escrúpulo, na música popular esse profissional é o que deveria ganhar todos, ou a maioria, dos louros. Sem ele, e sem sua maravilhosa equipe, boa parte dos cantores não sobrevivem (exemplo dos muitos cantores que só dublam suas canções, o tal do "play-back"...).

Voltemos às nossas óperas...

O custo de uma gravação em tais condições de fidelidade de som beira os US$600.000,00.

Nos últimos anos, o DVD barateou muito... Hoje os preços de venda de um CD e o de um DVD são comparáveis. Os tocadores de DVD também baixaram muito de preço.

O que fizeram as gravadoras? Gravações ao vivo! Com ou sem público, mas gravações ao vivo.

De um lado introduz-se a imagem, o som aceita alguns pequenos desaforos, pois que estamos entretidos com as imagens, aquele som do sapato do personagem indo de um lado para o outro do palco é suportável, as orquestras normalmente não produzem catástrofes sonoras... Que mais queremos?

O teatro está lá, os cantores, a orquestra e todos os envolvidos na produção estão lá também. Grava-se uma ópera com muito mais facilidade... A pós produção e todo o trabalho de eventualmete suprimir uma tosse extemporânea ou um rangido indesejável é muito simples se comparado com as gravações em CDs. Isso sem contar que todo o elenco "dá o sangue" nesse tipo de gravação.

Os cantores, o coro, a orquestra, o teatro e até eventualmente o público se unem num grande espetáculo. A gravação é a extensão de um espetáculo que já está pronto, ensaiado e montado. Por preciosismo pode-se gravar mais de uma récita e escolher cenas. Os recursos tecnológicos tais como a escolha das câmaras, os closes, a iluminação, tudo isso colabora com o resultado. O mesmo engenheiro de som, o todo poderoso do CD, usa seus poderes e ferramentas com muito mais parcimônia...

Total da fatura, aproximadamente US$200.000,00...

Leva-se o triplo do tempo para amortizar os custos de gravação em CD. Sorte nossa!

Assim podemos comparar cenários, figurinos, interpretações, expressões e toda a parte cênica que antes era sublimada nos CDs...

Interpretações de Maria Callas, que nos chegaram aos pedaços, mostram que ela além de divina cantora era uma atriz fora dos padrões da época e mesmo dos de hoje...

Já me referi aqui à sua atuação no segundo ato da Manon Lescaut de Puccini, na cena onde ela mata Scarpia, longos doze minutos onde ela não abre a boca, apenas interpreta. Sua interpretação foi passando de soprano a soprano e hoje, a maioria, se não todas, seguem a mesma linha de interpretação...

Como somos privilegiados... Gravações mais baratas resultam em custo mais barato. Bom para as gravadoras e excelente para nós, ouvintes e expectadores...

Resumo da ópera? DVD!

Jacques

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Blogger Dalva M. Ferreira said.

Excelente! conciso, direto, leve, informativo. Tudo que uma aula deve ter: "O bom, se breve, duas vezes bom."

19 maio, 2005 12:25  

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