terça-feira, fevereiro 07, 2006

O Narigudo...


Ao pesquisar fontes para falar sobre a ópera "Cyrano de Bergerac" que será levada ao ar pela Radio Cultura no próximo domingo, deparei-me com um artigo de Peter G. Davis do New York Magazine

Por se tratar de um apanhado não convencional, embora tivesse sido escrito para a estréia americana da ópera, no mesmo Metropolitan Opera de New York, em Maio de 2005, resolvi dar uma adaptada ao texto, omitindo algumas referências ao elenco daquela récita e traduzindo livremente um texto muito interessante.

O título, The Schnozz, claro, tinha que ser mantido.

"Um homem infeliz, Franco Alfano. Se o mundo da ópera tem alguma lembrança dele, é pelo fato de haver completado Turandot, uma ingrata tarefa que ele desencumbiu-se após a morte de Puccini em 1924, apenas para ver seu trabalho mutilado por Toscaninni e remendado, no final maculado, que conhecemos hoje.¹

Mais tarde, a partitura da melhor obra de Alfano, La Leggenda di Sakùntala de 1921, foi destruída durante um bombardeio da Segunda Guerra Mundial e teve de ser reconstituída a partir do zero, enquanto suas outras óperas foram quase que totalmente negligenciadas.

A vida pode ter tratado Alfano de maneira injusta, mas o socorro pode ter chegado. Em sua estréia no Metropolitan, em Maio de 2005, a ópera consegue um reconhecimento, ainda que tardio, graças a Plácido Domingo², que, praticamente em final de carreira, sentiu a necessidade de cantar o papel título da ópera Cyrano de Bergerac.

A produção é precedida de muita agitação não na figura de Alfano, mas como o nosso infeliz herói-nariganga e, especialmente, de como Plácido Domingo maneja o complicado mecanismo de seu falso nariz.

Para mim, Cyrano de Bergerac é a minha favorita entre as três obras de Alfano que conheço, cada uma das quais parece ter sido escrita por um autor diferente. A mais antiga Risurrezione (1904), baseada numa novela de Tolstoi, é a mais conhecida e a mais convencional, um ensaio no estilo tempestuoso do estilo denominado verismo que dominou a ópera italiana nos dias em que Puccini reinava de maneira suprema. Sakùntala, ao menos como foi reconstruida, é um incrível avanço que habita o mundo de Debussy, Ravel e, mesmo Stravinsky a reconheceriam, - um fascinante "tour de force" de coloração musical e um trançado vocal de declamação. Cyrano é uma obra tardia, de 1936 (Alfano vem a morrer em 1954) e aqui, trabalhando num libreto em francês de Henri Caen, o compositor encontra a reconciliação ideal entre a sua delicada aurora lírica e os seus mais maduros métodos de criação de atmosferas poéticas.

É moda para alguns de uma "elite" denegrir Alfano e outros compositores italianos de sua geração, um grupo de criatividade variada e musicalmente sofisticados apesar do seu idioma basicamente conservativo. Mesmo os críticos mais mordazes têm de admitir que Alfano pintou um arrojado retrato do eloqüente poeta-soldado Cyrano, que, enquanto duela no teatro do Hôtel de Bourgogne, corteja a atraente Roxane em frente ao tíbio Christian, luta na batalha de Arras na qual Christian é brutalmente massacrado e, finalmente, morre nos braços de Roxane, que descobre tardiamente a sua abnegada devoção. A música, brilhantemente, evoca a peça sempre vívida e com muita ação do século XVII, mas o clima é de doloroso pesar pelo inatingível, uma realidade que brota de cada um de seus três personagens principais. A deliciosa cena amorosa de três vias em frente ao balcão de Roxane, ao final do segundo ato incorpora isso em música de irônico sabor amargo-doce, enquanto a pungente morte de Cyrano, entre as folhas cadentes do átrio do convento é de quebrar o coração.

(...)"

Como vemos, o artigo acima, nos dá uma aula de crítica. Nela estão incluídas a sinopse (resumida) da obra bem como dados básicos da vida de Alfano. A parte final do artigo, aqui não traduzida, refere-se quase que inteiramente à produção de 2005, da qual, certamente, o cenário e a direção devem ter se escudado nessa produção de 2006.

Apesar disso, longe de contribuir para o entendimento da obra, Peter G. Davis, faz a crítica ao desempenho de Plácido Domingo, o que não é objeto de nossa audição.

Aos que tiverem interêsse na íntegra da crítica, poderão encontrar aqui o original.

Espero que esse artigo aguce a nossa curiosidade para uma obra relativamente esquecida do repertório operístico e que, no entanto, começa a sair deste seu limbo para um merecido renascimento.

Jacques

  • ² Placido Domingo não canta este papel na récita que ouviremos no próximo dia 12 de Fevereiro.

:

Blogger Dalva M. Ferreira said.

Opa, seguimos nos trilhos, pelo que vejo... Bem, comentário mesmo eu não tenho - sobre a originalidade da abordagem "transversa"? - sobre a acuidade das informações, sobre a oportunidade da mudança? Criticar não é fácil, ainda que haja pessoas que se intitulem críticas, sendo, ao invés disso, meros achincalhadores!!!

- Esta ópera, para mim, é inteiramente novidade! Que narizão feio!!!

09 fevereiro, 2006 04:29  
Blogger Dalva M. Ferreira said.

Verdade verdadeira? Não foi das melhores... talvez assistindo seja mais envolvente. Mas, como se diz, "if you don't have anything good to say, don't say anything at all!".

Esperemos a próxima. Parece que há grandes novidades no Met, não é?

13 fevereiro, 2006 09:01  

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