Les Troyens - Introdução Breve e Informações Interessantes
Photo: Marty Sohl
A Eneida de Virgílio, a fonte de Les Troyens de Berlioz, é um epopéia romana baseada em vários mitos e lendas gregas, particularmente na Ilíada de Homero, que conta a estória da Guerra Troiana, e na Odisséia, do mesmo autor, que relata a jornada de retorno do herói grego Odisseu (Ulisses) à pátria depois da tomada de Tróia. Apesar da Eneida utilizar personagens e mitos gregos, o livro realmente trata da origem e história de Roma. Como outros artistas romanos, Virgílio estava interessado em pintar um elo direto entre a riqueza filosófica, cultural e científica da Grécia Antiga à cultura romana.
Obviamente, Berlioz não poderia incorporar todas as estórias da Eneida em sua ópera. Aqui estão algumas das informações que Berlioz conhecia sobre as personagens em Les Troyens mas deixou de fora de seu libreto.
Cassandra (Cassandre, em Les Troyens) era a filha do Rei Príamo e rainha Hécuba. A mitologia grega nos conta que quando Cassandra e seu irmão gêmeo, Heleno, eram crianças, eles foram brincar no santuário de Apolo. Os gêmeos brincaram até que ficou muito tarde para voltarem a casa e uma cama foi arranjada para eles dentro do templo. Na manhã, a ama dos garotos encontrou as crianças a dormir, enquanto duas serpentes lhe passavam a língua pelos sentidos. A ama ficou aterrorizada, mas as crianças estavam ilesas. Depois, o ouvido dos gêmeos ficou tão sensível que eles podiam escutar as vozes dos deuses.
Cassandra tornou-se uma jovem bela e religiosa que passou tanto tempo dentro do templo de Apolo que o próprio deus se apaixonou por ela. Ele a ensinou os segredos da profecia; Cassandra tornou-se uma profetiza, mas se negou a dormir com o deus. Para vingar-se, Apolo lançou uma maldição contra ela: desde aquele dia, ninguém jamais acreditaria em suas profecias.
Em Les Troyens, Cassandra se suicida ao invés de se deixar violar e escravizar. Mas os autores gregos, especialmente Ésquilo, contaram uma estória diferente. De acordo com eles, Cassandra, que era uma prioresa virgem, foi estuprada no altar de Minerva pelo herói grego Ájax. Depois foi escravizada e dada ao líder grego Agamêmnon. Agamêmnon fez de Cassandra sua amante e a levou para viver com ele em seu reino, Micenas. Contudo, ao chegar a Micenas, ambos foram assassinados pela esposa do rei, Clitemnestra.
Hector (Hector, em Les Troyens) foi o maior herói troiano e sua morte foi o começo do fim para Tróia. Filho do rei Príamo e da rainha Hécuba (e irmão de Cassandra e Páris), Heitor liderou muitos dos ataques contra os gregos. Ele matou muitos gregos, o mais importante sendo Pátroclo, melhor amigo do herói grego Aquiles. Aquiles vingou a morte de Pátroclo matando Heitor e arrastando o corpo do herói morto em volta das muralhas de Tróia com sua carruagem. Aquiles estava tão inflamado que negou-se a liberar o corpo de Heitor para um enterro. Foi somente quando o próprio Rei Príamo entrou no campo grego para implorar pelo corpo de seu filho que Heitor teve um funeral adequado.
A redação mais extensiva sobre Enéias (Enée, em Les Troyens) é encontrada na Eneida de Virgílio, mas a personagem também é uma figura central na Ilíada e em outras narrativas gregas.
Enéias era o filho de Afrodite, deusa grega do amor, com o guerreiro troiano Anquises. Durante a guerra de Tróia, Enéias lutou com coragem — mas foi protegido do perigo pelos deuses, que sabiam que ele estava destinado a reinar sobre os troianos que sobrevivessem a guerra. Quando os gregos finalmente saquearam Tróia, o fantasma de Heitor alertou Enéias a escapar e instruiu-lhe a fundar uma nova Tróia. (Em Les Troyens, Heitor especifica a Itália como local da nova Tróia; na Eneida, não). Enéias escapou da cidade com seu filho Ascânio, sua esposa Creusa, e seu pai Anquises. Creusa se perdeu no tumulto da cidade em chamas e Anquises estava tão fraco que Enéias teve que levá-lo às costas.
Fora de Tróia, Enéias encontra-se com outros refugiados troianos. Juntos, eles estendem as velas em busca de um novo lugar para reconstruir Tróia. Infelizmente, a deusa Juno (Hera), que odiava tudo o que era troiano, sabotou a expedição em toda oportunidade que teve. Enéias e seus seguidores peregrinaram por seis anos. Neste período, eles tentaram estabelecer-se na Trácia, onde os arbustos sangraram, revelando um crime horrível cometido naquele solo; e em Creta, onde sua safra não cresceu e uma praga a fulminou. Depois os viajantes foram até tentados a unir-se a uma comunidade de outros exilados troianos que construíram uma Tróia em miniatura.
Enéias e seus seguidores conheceram a famosa Sibila, que vaticinou os sofrimentos pelo qual passariam e descreveu a terra onde eventualmente se estabeleceriam. Eles também visitaram a ilha de Ciclope. Finalmente, os refugiados aportaram em Sicília, onde Anquises morreu. Ao deixar a Sicília para ir à Itália, os planos de Enéias uma vez mais foram sabotados por Juno. Uma tempestade lança a frota para a costa de Cartago, onde ele e seus seguidores refugiam-se na corte de Dido.
Dido já havia passado por muitas angustias antes de seu malogrado romance com Enéias. Ela era a filha de Muto (ou Belo), rei de Tiro. Dido (Didon, na ópera) cresceu e casou-se com o rico Sicarbas, enquanto que seu irmão Pigmalião herdou o reino. Cobiçoso da riqueza de seu cunhado, Pigmalião mata Sicarbas — mas Dido escapa com o tesouro antes que seu irmão possa confiscá-lo. Ela navegou para longe de Tiro com um grupo de amigos e refugiados.
Dido e seus seguidores estabeleceram-se no norte da costa africana, contrário à Sicília. Dido não conquistou o território. Do contrário. Ela pediu aos nativos tanta terra quanta pudesse conter-se numa pele de boi. Os nativos concordaram. Dido cortou a pele de boi em tiras muito finas e obteve assim um fio comprido com que circundou território suficiente para construir uma cidadela. Esta fortaleza tornou-se o centro da poderosa cidade-estado de Cartago.
Por séculos, Cartago foi o único Estado no mediterrâneo que podia rivalizar Roma. Da metade do Século III A.C. ao Século II A.C., Roma e Cartago ingressaram numa série de lutas conhecidas como as Guerras Púnicas. A memória destas guerras era pouco menos que centenária quando Virgílio escreveu a Eneida.
Em Les Troyens, Dido, pouco antes de morrer, tem uma visão do general cartaginês Aníbal. Aníbal foi uma figura histórica, um brilhante estrategista e notável general que liderou o exército cartaginês na segunda Guerra Púnica. Desde cedo, Aníbal foi levado a jurar eterno ódio a Roma. Quando cresceu, Aníbal tentou destruir a república romana marchando dentro da capital. Ele comandou seu exército desde a Espanha ( a qual havia sido conquistada pelo pai de Aníbal) até Gaul (atual França). De Gaul seu exército cruzou os Alpes, perdendo milhares de homens para o frio e terreno tosco. No momento em que chegaram à Itália, as forças cartaginesas não estavam à altura dos romanos. Apesar de conseguir capturar um número substancial de territórios italianos, sua invasão foi um fiasco e ele foi derrotado.
Mercúrio (Hermes) era o mensageiro dos deuses gregos. Em Les Troyens, ele adverte Enéias para seguir seu rumo em direção à Itália. Este tipo de intervenção direta em assuntos mortais é típico das estórias sobre deuses gregos e romanos. Por exemplo, muitas vezes os próprios deuses seduziam os humanos: Enéias foi produto de tal união, entre Anquises e Afrodite. Eles também tinha amigos e inimigos mortais. Por exemplo, na Eneida, Juno, que certa vez foi desprezada pelo príncipe troiano Páris, odeia todos os troianos. Ela faz o possível para torturar e frustrar Enéias e seus seguidores. A Ilíada é também cheia deste tipo de contato entre deuses e homem. Quase todo grande deus escolhe um lado na guerra de Tróia e trabalha incessantemente para fazer com que seu lado saia vencedor. Os deuses ajudam e protegem seus aliados mortais, causam encrenca para seus inimigos, e lutam uns com os outros por assuntos terráqueos.
Jacques
Baseado em texto publicado no site do Metropolitan Opera International Radio Broadcast Information Center
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